Reumatologia
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Artrite reumatoide: sintomas, diagnóstico e como tratar

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Equipe medclub
Publicado em
18/3/2024
 · 
Atualizado em
18/3/2024
Índice

A artrite reumatoide (AR) é uma doença crônica autoimune sistêmica que afeta predominantemente as articulações. Nesse contexto, a condição desencadeia lesões mediadas por citocinas, quimiocinas e metaloproteases. 

A inflamação simétrica das articulações periféricas, como punhos e articulações metacarpofalângicas, é uma característica proeminente, frequentemente culminando na deterioração progressiva das estruturas articulares. Além dos impactos nas articulações, a artrite reumatoide pode se manifestar com sintomas sistêmicos, ampliando a complexidade e abrangência dessa condição autoimune.

Epidemiologia 

A artrite reumatoide é uma condição que impacta aproximadamente 1% da população, sendo mais prevalente nas mulheres, afetando-as de 2 a 3 vezes mais do que os homens. O seu surgimento pode ocorrer em qualquer faixa etária, com maior incidência entre os 35 e 50 anos, embora seja possível o seu início já na infância. Nos Estados Unidos e nos países do norte da Europa, a incidência é cerca de 40 por 100.000 pessoas.  

Aproximadamente 40% dos pacientes experimentarão incapacidade para o trabalho em um período de 10 anos e redução na qualidade de vida relacionada à saúde, tanto no aspecto físico quanto no mental, quando comparados à população em geral. 

Estima-se que até 25% desses pacientes necessitarão de uma substituição articular nos primeiros 20 anos após o início da doença. Além disso, a artrite reumatoide está associada a um aumento significativo no risco de desenvolver diversas doenças crônicas, tais como:

  • Doenças cardiovasculares
  • Distúrbios pulmonares
  • Problemas psiquiátricos
  • Osteoporose e fraturas
  • Doenças malignas (linfoma, câncer de pulmão e câncer de pele não melanoma) 

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Etiopatogênese 

A predisposição genética, identificada principalmente na população branca, está localizada no epítopo do lócus HLA-DRB1 da classe II de antígenos com histocompatibilidade. Além disso, considera-se que fatores ambientais possam desempenhar algum papel tanto no desencadeamento quanto na manutenção do processo inflamatório articular.

Os fatores de risco associados à artrite reumatoide incluem:

  • Tabagismo
  • Obesidade
  • Hormônios sexuais
  • Fármacos
  • Alterações no microbioma da boca, pulmão e intestino
  • Doença periodontal

As alterações no sistema imunológico incluem a produção de complexos imunes pelas células da membrana sinovial nos vasos sanguíneos inflamados. A partir disso, as células plasmáticas geram anticorpos, como fator reumatoide (FR) e anticorpos antipeptídeo citrulinado cíclico (anti-CCP), que contribuem para esses complexos. 

No entanto, a artrite erosiva pode ocorrer mesmo na ausência desses anticorpos. Na fase inicial da doença, os macrófagos e, principalmente, os linfócitos T CD4+ migram em grande quantidade para a sinóvia. Ao fazer essa migração produzem citocinas e quimiocinas pró-inflamatórias, como o fator de necrose tumoral-alfa (FNT-alfa), fator estimulante de colônia de macrófagos e granulócitos (GM-CSF), interleucinas e interferon-gama

Essa liberação de mediadores inflamatórios e enzimas contribui para as manifestações sistêmicas e articulares, incluindo a destruição cartilaginosa e óssea. Dessa forma, a progressão para a artrite reumatoide na fase pré-clínica depende da disseminação dos autoanticorpos e da subsequente resposta imunitária à liberação de autoantígenos.

Nas articulações cronicamente afetadas, a membrana sinovial prolifera, espessa e desenvolve pregas vilosas. As células da membrana sinovial produzem materiais como colagenase e estromelisina, contribuindo para a destruição da cartilagem, e interleucina-1 (IL-1) e FNT-alfa, que para além da destruição cartilaginosa, contribuem para a absorção óssea pelos osteoclastos, inflamação sinovial e produção de prostaglandinas. 

Para mais, há depósito de fibrina, fibrose e necrose. A hiperplasia do tecido sinovial, conhecida como pannus, provoca erosão de cartilagem, osso subcondral, cápsula articular e ligamentos, sendo composta, em média, por 60% de linfócitos polimorfonucleares no líquido sinovial.

Sinais e sintomas de artrite reumatoide 

A artrite reumatoide é uma doença, geralmente, de início insidioso, começando com sintomas articulares e sistêmicos. Os sintomas sistêmicos incluem fadiga generalizada, mal-estar, anorexia, fraqueza geral e, ocasionalmente, febre baixa. Já os sintomas articulares englobam dor, edema e rigidez

Em alguns casos, a doença tem um início súbito, simulando uma síndrome viral aguda. Durante os primeiros 6 anos, principalmente no primeiro ano, a doença progride mais rapidamente com curso imprevisível, resultando em anormalidades articulares permanentes em cerca de 80% dos pacientes dentro de 10 anos. 

Os sintomas articulares são tipicamente simétricos e a rigidez geralmente persiste por mais de 60 minutos após se levantar pela manhã, podendo ocorrer após qualquer período prolongado de inatividade. As articulações envolvidas tornam-se sensíveis, apresentando eritema, hipertermia, edema e limitação dos movimentos

As principais articulações envolvidas incluem punhos, articulações metacarpofalângicas do indicador e do dedo médio (as mais comumente afetadas), articulações interfalângicas proximais, articulação metatarsofalângica, ombros, cotovelos, quadris, joelhos e tornozelos. Entretanto, praticamente qualquer articulação, exceto as articulações interfalângicas distais (IFDs), pode estar envolvida.

As deformidades fixas, especialmente contraturas em flexão, podem evoluir rapidamente, apresentando características como desvio ulnar dos quirodáctilos com deslizamento dos tendões extensores das articulações metacarpofalângicas, deformidades em pescoço de cisne e deformidades em botoeira. 

Imagens mostrando os sinais e sintomas da artrite reumatoide
1 - Desvio ulnar; 2-Deformidades em pescoço de cisne; 3- Deformidades em botoeira. Fonte: Manual MSD

Instabilidade articular devido ao estiramento da cápsula articular pode ocorrer. A síndrome do túnel do carpo pode resultar de sinovite no punho que pressiona o nervo mediano. Ademais, Cistos poplíteos (Baker) podem se desenvolver, causando edema e sensibilidade na panturrilha, sugerindo trombose venosa profunda.

Imagem referenciando o cisto de Baker
Cisto de Baker. Fonte: Blog Dr. Adriano Leonardi

Os nódulos reumatoides subcutâneos geralmente não são um sinal inicial, mas acabam se desenvolvendo em até 30% dos pacientes, sobretudo em locais de pressão e irritação crônicas. Em geral, nódulos viscerais, como os pulmonares, são assintomáticos e podem ocorrer no tipo grave não sendo diferenciados de outra etiologia sem biópsia.

Imagens mostrando os 3 tipos de cistos
Observando a imagem da esquerda para a direita você verá nódulos ulnares, plantares e articulações metacarpofalangeanas. Fonte: Manual MSD

Outros sinais extra-articulares são: vasculites, isquemia digital ou mononeuropatia múltipla, derrames pleurais ou pericárdicos, bronquiolite obliterante, doença pulmonar intersticial, pericardite, miocardite, linfadenopatia, síndrome de Felty, síndrome de Sjögren, escleromalácia e episclerite.

O envolvimento da coluna cervical pode produzir subluxação atlantoaxial e compressão da coluna na doença ativa de longa duração. A instabilidade da coluna cervical costuma ser assintomática, no entanto, pode manifestar-se com dor radicular ou características de mielopatia, hiperreflexia e cefaleia occipital.

Raio-x mostrando o envolvimento da coluna cervical na artrite reumatoide
Envolvimento da coluna cervical na artrite reumatoide. Fonte: Kinanah Yaseen, MD.

Diagnóstico de artrite reumatoide 

Os critérios estabelecidos pelo American College of Rheumatology em 2010 utilizam um sistema de pontuação com base em um escore de soma direta, dividindo as manifestações em quatro grupos: 

  • Acometimento articular
  • Sorologia
  • Provas de atividade inflamatória 
  • Duração dos sintomas


A classificação de um paciente como tendo a doença ocorre quando a pontuação atinge ou ultrapassa 6. Vale ressaltar que esses critérios são de natureza classificatória, não diagnóstica, sendo desenvolvidos para definir populações homogêneas em pesquisas, mas podendo oferecer suporte ao diagnóstico clínico. 

Comparada aos critérios de 1987 do ACR, essa estratégia aumenta a sensibilidade do diagnóstico e permite a detecção precoce de casos. Importante notar que os critérios de 2010 visam classificar pacientes com manifestações recentes da doença. Por isso, mesmo pacientes com pontuação < 6/10, devem ser reavaliados, pois os critérios podem ser preenchidos cumulativamente ao longo do tempo.

Grupo Pontuação
Acometimento articular
1 grande articulação 0
2-10 grandes articulações 1
1-3 pequenas articulações (com ou sem envolvimento de grandes articulações) 2
4-10 pequenas articulações (com ou sem envolvimento de grandes articulações 3
>10 articulações (pelo menos uma pequena articulação) 5
Sorologia (pelo menos um resultado é necessário)
Fator reumatoide (FR) e anticorpos antipeptideos citrulinados cíclicos (anti CCP) 0
Fator reumatóide ou anti-CCP em baixos títulos 2
Fator reumatóide ou anti-CCP em altos títulos 3
Provas de atividade inflamatória (pelo menos 1 é necessário)
VHS e PCR normais 0
VHS ou PCR alterados 1
Duração dos sintomas
< 6 semanas 0
> 6 semanas 1
Critérios 2010 ACR-EULAR para classificação de artrite reumatoide. Fonte: Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas da Artrite Reumatoide

Indivíduos com doença erosiva característica de Artrite Reumatoide (AR) e histórico que está em conformidade com os critérios de 2010 devem ser categorizados como portadores desse tipo específico de artrite. Aqueles com doença de longa duração, mesmo inativa, que preenchem os critérios de 2010 com base em dados retrospectivos, também devem ser classificados da mesma maneira.

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Como tratar a artrite reumatoide? 

O tratamento envolve um equilíbrio entre medidas farmacológicas e não farmacológicas: 

  • Medidas de estilo de vida
  • Medidas físicas
  • Fármacos modificadores de doença
  • Fármacos sintomáticos
  • Cirurgia

Medidas de estilo de vida

O repouso absoluto no leito raramente é indicado, mesmo por curto período; entretanto, o repouso regular deve ser incentivado. Deve-se incentivar a melhoria na qualidade do sono, uma vez que o sono inadequado agrava a sensação de dor. Além disso, uma dieta nutricional comum é apropriada. 

Medidas físicas

A aplicação de ataduras e talas articulares desempenha um papel importante na redução da inflamação local, proporcionando alívio para sintomas intensos de dor e neuropatias compressivas. A crioterapia pode ser útil para diminuir a dor e o edema em uma articulação. Ainda, sapatos e tênis ortopédicos com bom apoio de arcos e bom salto são frequentemente úteis. 

A terapia ocupacional e dispositivos de autoajuda possibilitam que pacientes com artrite incapacitante realizem as atividades do cotidiano. Os exercícios devem ser realizados quando tolerados. Durante o processo de inflamação aguda é benéfica a realização de movimentos passivos para evitar contraturas em flexão. Para mais, a aplicação de calor local pode ser útil para aliviar a rigidez.

Cirurgia

A cirurgia é considerada se a terapia medicamentosa falhar, devendo ser individualizada com base na extensão da doença e expectativas do paciente. A artroplastia de substituição, especialmente em quadril e joelho, é indicada quando a lesão compromete significativamente a função. Outros procedimentos, como excisão de articulações metatarsofalângicas e fusões, podem melhorar a marcha e estabilidade. 

A artrodese cervical é necessária em casos de subluxação C1-C2 com dor intensa ou risco de compressão medular. A Artroscopia ou sinovectomia aliviam temporariamente a inflamação, mas a atividade da doença deve ser controlada para resultados duradouros. 

Terapia farmacológica

O tratamento envolve diferentes abordagens terapêuticas. Inicialmente, os anti-inflamatórios não esteroides (AINEs) podem ser utilizados para tratar os sintomas, mas não modificam o curso da doença. Corticoides sistêmicos também podem ser usados para controlar a inflamação, mas seu uso prolongado apresenta efeitos adversos.

Os fármacos antirreumáticos modificadores da doença (FARMDs), como o metotrexato, Leflunomida, hidroxicloroquina e sulfassalazina, visam desacelerar a progressão da doença

Em casos de resistência/intolerância aos tratamentos convencionais, recorre-se a fármacos mais específicos, como os agentes biológicos, que incluem antagonistas do fator de necrose tumoral (FNT)-alfa, inibidores da interleucina-6 (IL-6) e outras opções

Esses agentes podem ser combinados com outros fármacos para aumentar a eficácia, mas a combinação ideal ainda não está clara. Porém, não se administram agentes biológicos combinados devido ao aumento da frequência de infecção

Vale salientar que é fundamental individualizar o tratamento, considerando a resposta do paciente e ajustando as terapias conforme necessário. Ademais, monitorar possíveis efeitos adversos e realizar rastreamento para infecções são aspectos importantes na gestão da doença.

Conclusão 

A artrite reumatoide é uma doença autoimune crônica que afeta principalmente as articulações, levando a inflamação, dor e eventual destruição articular. Se não for diagnosticada e tratada precocemente, pode resultar em incapacidade significativa. Por isso, a abordagem multidisciplinar é essencial para melhorar a qualidade de vida dos pacientes e minimizar o impacto da doença.

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