Cardiologia
Cardiologia

Tromboembolismo venoso: o que é, como diagnosticar e tratar

Logo Medclub
Equipe medclub
Publicado em
6/9/2023
 · 
Atualizado em
8/9/2023
Índice

O tromboembolismo venoso (TEV) é uma condição médica com potencial letal, que envolve a formação de trombos nas veias, com subsequente deslocamento e possível obstrução de vasos sanguíneos vitais. Assim, compreender os sintomas, o diagnóstico e as opções de tratamento do TEV são cruciais para os médicos, a fim de fornecer cuidados eficazes e reduzir a morbimortalidade associada a essa condição. 

O que é tromboembolismo venoso?

O tromboembolismo venoso compreende duas entidades: a trombose venosa profunda (TVP), caracterizada pela oclusão do território venoso, sendo mais comum o acometimento dos membros inferiores; e o tromboembolismo pulmonar (TEP). Esse último é uma complicação potencialmente fatal do desprendimento de trombos em territórios venosos, sendo caracterizado por oclusão de artéria pulmonar.

No Brasil, a prevalência do TEP é de 3,9 a 16,6% na população geral. Em estudos com necropsias, a embolia pulmonar foi evidenciada em 9% dos pacientes com mortes por insuficiência respiratória. E mais, cerca de 50% dos pacientes com TVP apresentam TEP associada, sendo essa, em geral, assintomática. Para mais, nos pacientes com TEP, o TVP é diagnosticado em 60% dos casos.

Fisiopatologia

O tromboembolismo venoso é o resultado de uma complexa interação de três componentes, denominados Tríade de Virchow: lesão endotelial, estase sanguínea e hipercoagulabilidade. Assim, a lesão endotelial pode ser desencadeada por traumas, inflamações, procedimentos cirúrgicos ou doenças vasculares subjacentes.

Tríade de Virchow. Fonte: Vascular.pro (https://vascular.pro/triade-de-virchow/)

Esse processo facilita a exposição do subendotélio vascular, ativando as plaquetas e fatores de coagulação. Já a estase sanguínea pode ocorrer em situações de imobilização prolongada, de insuficiência cardíaca congestiva ou obstrução venosa. Essas situações promovem o acúmulo de componentes coagulantes. 

CTA: Para você ficar sabendo todos os detalhes temos uma aula exclusiva que trata desse assunto, confira no nosso streaming de atualização médica. O Medclub Prime tem um preço que cabe no seu bolso e vai te manter atualizado, o que é muito importante para o seu dia-a-dia

Quais os sintomas da tromboembolia venosa?

Os sintomas da tromboembolia venosa podem variar em intensidade e apresentação, dependendo da localização e extensão do trombo. Ela frequentemente manifesta-se com edema, dor, sensação de calor e eritema na área afetada. No entanto, é importante notar que nem todos os pacientes apresentam todos esses sintomas simultaneamente. 

Observe a perna direita deste paciente, que se apresenta edemaciada e eritematose em comparação com a perna esquerda. Fonte: Saúde Plena; link da fonte: https://www.uai.com.br/app/noticia/saude/colunistas/leonardo-bez/2020/01/08/noticias-saude,254322/entenda-o-que-e-a-trombose-venosa-profunda.shtml
Observe a perna direita deste paciente, que se apresenta edemaciada e eritematose em comparação com a perna esquerda. Fonte: Saúde Plena

Assim, são sinais clínicos presentes em 50% dos pacientes o sinal de Homans, o edema assimétrico - maior na perna acometida - o eritema e a dor localizada no trajeto venoso. Sendo o sinal de Homans a presença de dor ao se realizar a dorsiflexão passiva do membro acometido. Assista o vídeo abaixo para aprender como pesquisar o sinal de Homans corretamente.

Já na embolia pulmonar, o quadro típico é a dispneia de início súbito ou subagudo, taquipneia e dor torácica, estando pelo menos um presente em > 90% dos pacientes. Além disso, o paciente também pode apresentar dor pleurítica, que ocorre devido irritação pleural pela isquemia do parênquima pulmonar, sendo muitas vezes acompanhada pela hemoptise

Para mais, o paciente também pode apresentar síncope (15%), hipotensão e saturação baixa. Isso indica comprometimento do sistema cardiovascular, caracterizando pior prognóstico e maior mortalidade para o paciente.

Como diagnosticar o tromboembolismo venoso?

O diagnóstico preciso do tromboembolismo venoso é fundamental para evitar complicações graves e oferecer tratamento oportuno. Entretanto, devido à clínica muitas vezes inespecífica e oligossintomática, o diagnóstico pode ser dificultado. 

Trombose venosa profunda

escore de Wells facilita a avaliação da probabilidade clínica de TVP.

VARIÁVEL PONTUAÇÃO
Neoplasia em atividade (tratamento nos últimos 3 meses ou tratamento paliativo) +1
Paralisia, paresia ou imobilização recente nos membros inferiores +1
Cirurgia de grande porte nas últimas 4 semanas ou imobilidade no leito > 3 dias +1
Sensibilidade dolorosa em local de trajeto venoso profundo +1
Edema de perna inteira +1
Edema de panturrilha com diferença > 3 cm em relação à perna assintomática (medido 10 cm abaixo da tuberosidade tibial) +1
Edema compressível (maior que a perna assintomática) +1
Veias colaterais superficiais não varicosas +1
Diagnóstico alternativo de igual ou maior probabilidade -2
PROBABILIDADE CLÍNICA TOTAL
Baixa (4-8%) 0
Intermediária (13-23%) 1-2
Alta (44-61%) ≥ 3
Escore de Wells para avaliar probabilidade clínica de TVP. Fonte: Manual do Residente de Clínica Médica, 2017

Tromboembolismo pulmonar

O escore de Geneva é utilizado para determinar a probabilidade de tromboembolismo pulmonar.

VARIÁVEL PONTUAÇÃO
Fatores predisponentes:
Idade > 65 anos +1
TVP ou TEP prévio +3
Cirurgia ou fratura < 30 dias +2
Neoplasia ativa +2
SINTOMAS
Dor unilateral nas pernas +3
Hemoptise +2
SINAIS
FC 75-94bpm +3
FC ≥ 95 bpm +5
Dor em trajeto venoso de membro inferior ou edema unilateral +4
PROBABILIDADE CLÍNICA PONTUAÇÃO TOTAL
Baixa 0-3
Intermediária 4-10
Alta ≥ 11
Escore de Geneva modificado para avaliação de probabilidade de TEP. Fonte: Manual do Residente de Clínica Médica, 2017

D-dímero

O D-dímero é um produto da degradação da fibrina, e sua presença em níveis normais tem alto poder de exclusão de TEV. Entretanto, esse marcador não é específicopara o problema, podendo estar aumentado em situações como infecções, neoplasias e inflamações. Por isso, valores altos de D-dímero não são específicos para essa condição.

USG de Doppler Venoso

A Ultrassonografia de Doppler Venosa é frequentemente utilizada como método inicial para confirmar a presença de TVP, permitindo a visualização direta dos trombos e a avaliação do fluxo sanguíneo. Tem sensibilidade > 90% e especificidade > 95%, e substitui a venografia por causa da maior disponibilidade. 

A USG avalia veias femorais e poplíteas (veias proximais) e o trajeto venoso da panturrilha. Em 90% dos casos, as embolias pulmonares têm origem nos membros inferiores, geralmente devido a tromboses proximais, portanto, o achado de trombose venosa profunda proximal em pacientes com suspeita de tromboembolismo pulmonar é suficiente para início de anticoagulantes, sem necessidade de prosseguir com a tomografia computadorizada.

Angiotomografia Computadorizada

No caso de EP suspeita, a Tomografia Computadorizada (TC) de tórax com contraste é um exame-chave para identificar obstruções vasculares pulmonares e avaliar a extensão da lesão, identificando até mesmo ramos subsegmentares pulmonares. Observe a imagem abaixo, que demonstra em TEP maciço, ou seja, uma oclusão bilateral das artérias pulmonares.

Observe a perna direita deste paciente, que se apresenta edemaciada e eritematose em comparação com a perna esquerda. Fonte: Saúde Plena. link da fonte: https://www.uai.com.br/app/noticia/saude/colunistas/leonardo-bez/2020/01/08/noticias-saude,254322/entenda-o-que-e-a-trombose-venosa-profunda.shtml
Observe a perna direita deste paciente, que se apresenta edemaciada e eritematose em comparação com a perna esquerda. Fonte: Saúde Plena

Como tratar a tromboembolia venosa?

Os anticoagulantes, medicações preconizadas no tratamento do TEV, não irão atuar dissolvendo o trombo, mas sim, diminuindo seus riscos de progressão, reduzindo as chances de novos eventos. Assim, é o próprio sistema fibrinolítico endógeno do paciente que provocará a dissolução do trombo.

Por isso, a anticoagulação deve ser iniciada o mais precocemente possível em todos os pacientes com tromboembolismo venoso, exceto se houver risco muito elevado para sangramentos.

As heparinas são frequentemente empregadas como tratamento inicial. Assim, a heparina de baixo peso molecular (HBPM), também conhecida como enoxaparina, é utilizada na dose de 1mg/kg em 12/12 horas, via subcutânea. Já a heparina não fracionada (HNF) tem uma farmacocinética imprevisível e, por isso, é necessária a dosagem do TTPa, com manutenção de seus valores entre 1.5 e 2.5.

Já as varfarinas, medicações antagonistas da vitamina K, podem ser iniciadas nas doses de 5mg/dia na maioria dos pacientes. Entretanto, devem ser associadas à heparina por pelo menos 5 dias no tratamento do TEV, devido ao seu efeito anticoagulante ter início após 36 ou 72 horas, com efeito pleno em até 5 dias. Assim, suspende-se a heparina quando o paciente atingir valores de INR entre 2 e 3 por 2 dias consecutivos.

Para mais, também pode ser utilizado para o tratamento da TEV os novos anticoagulantes orais (NOAC): os inibidores do fator Xa e os inibidores diretos da trombina. Devido a seu efeito imediato, os NOAC não devem ser utilizados em associação com as heparinas.

Inibidores do fator Xa Inibidores direto da trombina
Rivaroxaban
15 mg 2x/dia por 21 dias 🡪 20 mg 1x/dia



Dabigatran
150 mg 2x/dia
Apixaban
10mg 2x/dia por 7 dias 🡪 5mg 2x/dia
Endoxaban
30 a 60 mg/dia
Doses dos NOAC. Fonte: MedClub

Assim, o tratamento do tromboembolismo venoso é constituído de três fases: a fase inicial, em que são iniciados anticoagulantes parenterais por 5 a 7 dias, em que comumente são utilizadas as heparinas, com posterior transição para a medicação oral. Posteriormente, há o período de longa duração, realizado durante 3 meses.

Ele consiste na continuação do uso das heparinas, como no caso das gestantes, ou em sua troca pela varfarina. Por fim, a terceira fase, caracterizada pela continuação desta anticoagulação por período extensivo, é avaliada de acordo com o evento agudo e presença de fatores de risco irreversíveis.

A anticoagulação por período extensivo ou indefinido é recomendada para pacientes com TEV sem fator de risco maior (ex.: fraturas de perna ou quadril, cirurgias ortopédicas, cirurgias de grande porte, traumas importantes, lesões medulares), em pacientes com fator de risco maior persistente (ex.: gestação, neoplasias ativa) e em pacientes com SAAF

ANTICOAGULANTES INDICAÇÕES
Heparina de Baixo Peso Molecular Gestantes e pacientes com câncer
Heparina Não Fracionada Instabilidade hemodinâmica e insuficiência renal (clearence < 30)
Novos Anticoagulantes Orais Contraindicados na gestação/lactação e na insuficiência renal
Fondaparinux Trombocitopenia induzida por heparina
Warfarin Insuficiência renal e Síndrome do Anticorpo Antifosfolípide (SAAF)
Fonte: Medclub

Na realidade da maioria dos hospitais brasileiros, o tratamento do TEV consiste na utilização da HBPM logo após o diagnóstico, com sobreposição da varfarina logo após o controle da anticoagulação oral (INR 2-3)

Entretanto, caso seja optado por realizar o tratamento com um NOAC, pode-se iniciar o tratamento da fase inicial com a apixabana ou a rivaroxabana de 5 a 10 dias. Isso porque, diferentemente da varfarina, seu efeito anticoagulante é imediato. Entretanto, a edoxabana e o dabigatran apenas podem ser iniciados após 5 a 10 dias do uso da HBPM.

Trombólise

Já a trombólise pode ser considerada em casos graves de TEP com instabilidade hemodinâmica. Assim, recomenda-se que seja feita quando houver pressão arterial sistólica (PAS) < 90 mmHg, ou quando houver queda > 40 mmHg na PAS por pelo menos 15 minutos. Assim, agentes fibrinolíticos são administrados para dissolver o trombo, exigindo monitoramento rigoroso.

Filtro de Veia Cava Superior

Por fim, o Filtro de Veia Cava Superior pode ser utilizado em situações em que a anticoagulação é contraindicada, ou quando recorrências ocorrem apesar do tratamento adequado. Esses dispositivos ajudam a prevenir a ocorrência de tromboembolismo pulmonat, entretanto, aumentam o risco de trombose venosa profunda.

Se você quiser saber mais sobre este assunto acesse o nosso streaming de atualização médica, para assistir de onde e quando quiser. Sabe aquela dúvida que aparece no meio do plantão!? Os conteúdos atualizados do Medclub prime podem te ajudar a obter ainda mais êxito na sua prática médica

Profilaxia para o tromboembolismo venoso

O TEV é a principal causa de morte evitável em pacientes hospitalizados e, por isso, realizar a profilaxia adequada é fundamental. Assim, a profilaxia farmacológica é a primeira escolha, sendo feita a escolha pela utilização da HBPM na dose de 40 mg/dia, ou a HNF de 5.000 UI 12/12 ou 8/8 horas

Ou ainda, pode-se utilizar o fondaparinux na dose de 2,5 mg/dia. Exceção são os pacientes submetidos a cirurgias ortopédicas, que devem utilizar o ácido acetilsalicílico (AAS), a varfarina ou os NOAC como primeira escolha para a profilaxia de tromboembolismo venoso.

Entretanto, quando o paciente não pode fazer uso dos métodos farmacológicos, é possível realizar métodos mecânicos para a profilaxia, como o uso das botas pneumáticas. Assim, a profilaxia deve ser mantida até a alta hospitalar, ou até o retorno da deambulação.

Por fim, para auxiliar nesta escolha, é possível utilizar os critérios de Padua. Quando a pontuação for ≥ 4, está indicada a profilaxia para o paciente. Veja a seguir: 

Câncer, história de TEV, imobilidade, trombofilia laboratorialmente confirmada 3 pontos cada
Trauma ou cirurgia recente (≤ 1 mês) 2 pontos cada
Idade ≥ 70 anos, IAM ou AVC agudo, infecção aguda, doença reumatológica, IMC ≥ 30, terapia de reposição hormonal 1 ponto cada
Escore de Padua para avaliação do risco de TEV em pacientes clínicos. Fonte: Manual do Residente de Clínica Médica, 2017

Conclusão

O tromboembolismo venoso é uma condição médica que exige conhecimento profundo e abordagem clínica meticulosa. A compreensão da fisiopatologia, dos sintomas, do diagnóstico e das opções de tratamento é essencial para proporcionar cuidados de qualidade e prevenir complicações potencialmente fatais. 

Continue aprendendo:

FONTES:

  • LIP, G. Y. H., HULL, R. D. Venous thromboembolism: Initiation of anticoagulation. UpToDate. 2023. Acesso em: 30/08/2023. Disponível em:
  • MARTINS, M. R. Manual do Residente de Clínica Médica. 2a edição. Barueri: Manole, 2017.
  • FAUCI, Jameson. et al. Medicina Interna de Harrison. Porto Alegre: AMGH, 2020.

Assine o medclub e tenha acesso a um mundo de informações médicas

Aproveite por 30 dias gratuitamente e após esse período pague apenas R$29,90 por mês.

Artigo escrito por

Comece agora e tenha acesso a um mundo de informações médicas

Aproveite por 30 dias gratuitamente e após esse período pague apenas R$29,90 por mês.

Dúvidas?

O que é o MedClub?

O medclub é uma plataforma 100% online e responsiva focada no desenvolvimento e capacitação profissional dos médicos. Com videoaulas e materiais de apoio de alta qualidade, o médico é alavancado em uma dinâmica simples, clara e objetiva de atualização e aprimoramento dos conhecimentos essenciais à sua prática.

Como o MedClub pode me beneficiar?

O Medclub te proporciona a aplicabilidade prática da Medicina Baseada em Evidências, elevando o padrão da sua prática médica. Tudo isso em um só lugar, sem perda de tempo, com informações claras e fáceis de achar no dia a dia.

O MedClub beneficia médicos de diferentes níveis de experiência?

Sim! O MedClub foi cuidadosamente concebido e desenvolvido com o objetivo de simplificar o estudo e a atualização médica, proporcionando maior segurança nas práticas e procedimentos. Nossa plataforma visa melhorar os resultados diários dos médicos, abordando as principais preocupações independentemente do estágio de sua carreira.

Existe um prazo de garantia?

Com certeza! No MedClub, estamos comprometidos com você. Por isso, disponibilizamos 30 dias corridos gratuitos antes de qualquer pagamento ser debitado em sua conta, garantindo que sua assinatura entre em vigor apenas quando você estiver pronto.

Como faço para cancelar minha assinatura?

Ao iniciar sua assinatura no MedClub, você terá a flexibilidade de cancelá-la a qualquer momento diretamente na plataforma, podendo também cancelar entrando em contato com nossa equipe de suporte ou enviando um e-mail para contato@med.club.

Nós utilizamos cookies. Ao navegar no site estará consentindo a sua utilização. Saiba mais sobre o uso de cookies.