Clínica Médica
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Osteoartrite: Fisiopatologia, quadro clínico e tratamento

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Equipe medclub
Publicado em
27/2/2023
 · 
Atualizado em
7/5/2023
Índice

Por: Ellen Kosminsky

A osteoartrite (OA), antigamente denominada osteoartrose, é a doença reumatológica mais comum na prática clínica, sendo responsável por 30% a 40% das procuras por especialistas dessa área. É uma doença muito relevante, porque pode causar importante incapacitação devido aos sintomas dolorosos e/ou destruição articular.

Assim, 7,5% de todos os afastamentos do trabalho decorrem da osteoartrite. É mais frequente em mulheres, e tem seu pico de incidência aos 50 anos de idade. Além disso, há uma prevalência estimada de 4,1% na população brasileira. Entretanto, não há dados demográficos em pacientes assintomáticos e, por isso, estima-se que a real prevalência seja subestimada. 

Isso porque, considerando achados radiográficos, estima-se que 85% dos indivíduos entre 55 e 84 anos apresentam algum grau da doença. E mais, após os 85 anos, estima-se que acometa 100% dos pacientes.

O que é a osteoartrite?

A osteoartrite é uma doença degenerativa que afeta as articulações, cursando com falha estrutural e funcional das articulações sinoviais. É decorrente de processos inflamatórios, mecânicos e, por vezes, genéticos. Além disso, acomete a cartilagem articular, o osso subcondral, ligamentos, meniscos dos joelhos e músculos

Fisiopatologia da osteoartrite

A cartilagem articular hialina é um tecido avascular e aneural, envolvido por líquido sinovial. É constituída por condrócitos e matriz extracelular (ME), esta última compondo a maior parte da cartilagem. 

Lâmina histológica da cartilagem hialina. Perceba que a maior parte é formada por ME, que envolve os condrócitos. Fonte: Histologia Básica: Texto e Atlas, 2018
Lâmina histológica da cartilagem hialina. Perceba que a maior parte é formada por ME, que envolve os condrócitos. Fonte: Histologia Básica: Texto e Atlas, 2018

A ME apresenta importante propriedade viscoelástica, que auxilia na absorção de impactos na articulação. É produzida pelos condrócitos, e é composta por água, colágeno tipo II, proteoglicanos e glicosaminoglicanos. 

Os glicosaminoglicanos são compostos por sulfato de condroitina (SC) e ácido hialurônico (AH), que se ligam e formam uma rede fundamental para o pleno funcionamento da cartilagem.

Representação da organização molecular da cartilagem hialina. Fonte: Histologia Básica: Texto e Atlas, 2018
Representação da organização molecular da cartilagem hialina. Fonte: Histologia Básica: Texto e Atlas, 2018

Assim, nesta doença, há um aumento da atividade catabólica dos condrócitos, resultante do estresse bioquímico e metabólico sobre a articulação, provocando degradação da ME e falha no seu reparo. Dessa forma, há aumento na produção de enzimas de destruição da cartilagem (metaloproteinases) e, com o tempo, o catabolismo da matriz extracelular irá superar o anabolismo.

Sendo assim, um dos marcos na degeneração da cartilagem na doença consiste na perda da homeostase na formação da matriz extracelular. A rede de colágeno formado pelo SC e pelo AH é desfeita, e os proteoglicanos, por sua propriedade hidrofílica, atraem a água disponível na matriz. Por isso, o primeiro sinal da osteoartrite é o aumento da água nas articulações.

Para mais, com a degradação progressiva da cartilagem, haverá morte de condrócitos, e a ME ficará desprovida de células para auxiliar na sua regeneração. Dessa forma, haverá uma insuficiência da cartilagem articular

Por fim, à medida que ocorre a degradação por processos inflamatórios, haverá também disfunção ligamentar, hipertrofia sinovial e produção de osteófitos. Bem como dano meniscal, remodelamento ósseo e lesão da cartilagem. E ainda, atrofia muscular e esclerose do osso subcondral.

Representação dos processos fisiopatológicos da osteoartrite. Fonte: Histologia Básica: Texto e Atlas, 2018
Representação dos processos fisiopatológicos da osteoartrite. Fonte: Histologia Básica: Texto e Atlas, 2018
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Fatores de risco

Os principais fatores de risco que predispõem ao surgimento da osteoartrite são a idade, fatores mecânicos (esforço, traumas, lesão de menisco ou ligamentos) e a obesidade. Essa última contempla um dos fatores de risco devido à sobrecarga mecânica, bem como aos processos inflamatórios intrínsecos da obesidade.

Para mais, fatores genéticos também são também importantes, assim como o sexo feminino e fatores anatômicos, como as malformações, a displasia de quadril, valgismo e varismo.

Paciente com joelho varo. Fonte: Dr. João Hollanda; link da fonte: https://ortopedistadojoelho.com.br/joelho-varo-no-adulto/
Paciente com joelho varo. Fonte: Dr. João Hollanda

Quadro clínico

O principal sintoma do paciente é a dor, que pode ser acompanhada ou não por limitação funcional da articulação, causada pela própria dor ou por processo inflamatório avançado. E mais, a pessoa pode apresentar rigidez articular, devido a redução do espaço articular ou acometimento de estruturas periarticulares. Por fim, deformidades articulares também podem estar presentes.

Todavia, a cartilagem hialina é aneural. Por isso, nos estágios iniciais, o quadro clínico costuma ser assintomático. A dor ocorre quando o processo inflamatório atinge estruturas como enteses, ligamentos e do osso subcondral, que são estruturas ricas em receptores nociceptivos.

Para mais, com a cronificação deste processo inflamatório, há um processo de neuromodulação e centralização da dor. Por isso, a dor crônica pode levar a um quadro secundário de fibromialgia, por exemplo.

E ainda, a dor é de carácter mecânico, ou seja, é uma dor localizada, comumente com presença de pontos dolorosos na articulação acometida. Sendo assim, a dor não é difusa - com piora nos movimentos ou esforço e melhora da dor com o repouso. E mais, geralmente não há rigidez pós repouso e essa, quando presente, não dura mais que 30 minutos.

Diagnóstico

O diagnóstico é predominantemente clínico, muitas vezes não sendo necessários exames laboratoriais ou de imagem. A presença da dor mecânica, com rigidez < 30 minutos, acometimento de joelhos, mãos e quadris é sugestiva.

Além disso, a presença de deformidades nas articulações ao exame físico, bem como aumento do volume - devido ao aumento do líquido sinovial, sinovite crônica, bursite e/ou aumento do volume ósseo - nódulos (mãos) e crepitações (principalmente nos joelhos) também são achados sugestivos da doença . E mais, calor, instabilidade e limitações articulares também podem estar presentes.

Nódulo de Heberden (articulações falangeanas distais) e de Bouchard (articulação interfalangeanas proximais). Fonte: Nona Enfermaria Clínica Médica; link da fonte: https://nonaenfermaria.blogspot.com/2009/08/nodulos-de-heberden-e-bouchard.html

Para mais, a afecção afeta mais comumente determinadas articulações. Conhecer o padrão de acometimento articular da doença é fundamental para o diagnóstico diferencial com outras condições, como a artrite reumatoide, a artrite psoriática e a artrite lúpica. Observe a tabela abaixo.

Além disso, quando necessários, deve-se solicitar exames laboratoriais para realizar o diagnóstico diferencial em pacientes com sintomas atípicos e locais dolorosos incomuns, bem como na presença de sinais de inflamação articular. Além disso, quando necessário, o raio-X é o exame de imagem de escolha para avaliação do paciente com suspeita de osteoartrite.

Exames laboratoriais

Solicita-se hemograma, para avaliação de possível acometimento metabólico ou infeccioso, proteína-C reativa e ácido úrico, para o diagnóstico diferencial com a artrite por Gota. E mais, fator reumatóide e anti-CCP, quando houver suspeita de artrite reumatóide ou outras artrites soronegativas.

Para mais, a análise do líquido sinovial deve ser pedida para realizar o diagnóstico diferencial com a artrite infecciosa ou microcristalina. É preciso suspeitar de alguma dessas condições em caso de acometimento assimétrico dos joelhos, bem como presença de dor mais significativa e com mais edema do que o esperado na OA.

Assim, o líquido sinovial da osteoartrite apresenta as seguintes características

  • Coloração amarelo-citrina 
  • Presença de 0 a 2.000 células com < 25% de polimorfonucleares 
  • Alta viscosidade 
  • Ausência de bactérias gram-negativas
  • Pesquisa de microcristais negativa.

Radiografia

O raio-X de joelho não é imprescindível. Entretanto, devemos solicitá-lo caso haja acometimento de mãos, quadril, pés ou coluna. Além disso, é preciso recordar que comumente há uma dissociação clínico-radiológica

Isso significa dizer que a radiografia pode demonstrar importante lesão osteoarticular, e o paciente apresentar poucos sintomas. Ou ainda, o indivíduo pode apresentar queixas de dores intensas nas articulações acometidas sem, entretanto, haver presença de grandes degenerações no exame de raio-X.

São achados comuns nesse exame a esclerose subcondral, a osteofitose e a redução/desalinhamento do espaço articular, além da presença de cistos subcondrais e erosões. A classificação de Kellgren-Lawrence é muito utilizada na prática para classificar o grau de acometimento das articulações na osteoartrite.

Raio-X de joelho demonstrando alterações ecográficas compatíveis com osteoartrite. Fonte: Dr. João Hollanda; link da fonte: https://ortopedistadojoelho.com.br/artrose-no-joelho/
Raio-X de joelho demonstrando alterações ecográficas compatíveis com osteoartrite. Fonte: Dr. João Hollanda
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Tratamento para osteoartrite

O tratamento da osteoartrite consiste nas medidas farmacológicas e não farmacológicas. Entretanto, não há estratégias que impeçam a progressão do dano estrutural e, dessa forma, o objetivo do tratamento é o alívio da dor e a melhora da funcionalidade do paciente.

Tratamento não farmacológico

O tratamento não farmacológico consiste na educação, autogestão da doença e definição de metas para a modificação do comportamento do paciente. Assim, é recomendado evitar a sobrecarga mecânica, como subir escadas, e a realização de exercícios de alta intensidade e que impactem as articulações acometidas.

E mais, recomenda-se a realização de exercícios físicos de baixo impacto, como caminhadas, ciclismo e hidroginástica e exercícios resistidos, como a musculação. Além disso, o uso de dispositivos de marcha, como bengalas, e a aplicação de modalidades térmicas, ou seja, aplicação de calor ou frio sobre as articulações também é recomendado.

Tratamento farmacológico

O tratamento farmacológico subdivide-se em tratamento medicamentoso com drogas analgésicas e anti-inflamatórias e com as medicações condroprotetoras. Para mais, é fundamental tratar outras comorbidades frequentemente associadas à doença, são exemplos a obesidade, a sarcopênica e doenças psicossomáticas como a depressão e a ansiedade.

Analgésicos e anti-inflamatórios

São exemplos de analgésicos que podem ser utilizados no tratamento a dipirona na dose de 1 g/dia por 6/6 hr, bem como o paracetamol, na dose de 750mg de 6/6 hr, e dose máxima de 3 mg/dia.

Os anti-inflamatórios não esteroidais (AINEs) utilizados podem ser tópicos, como o diclofenaco em gel, ou sistêmicos, como o ibuprofeno na dose de 600mg de 8/8 horas. Entretanto, convém recordar as limitações desta classe medicamentosa em pacientes idosos, devido ao maior risco de lesões hemorrágicas gastrointestinais, aumento do risco de eventos cardiovasculares e de déficit da função renal.

Além desses, pode-se utilizar corticóides injetáveis. E ainda, opióides fracos, como o tramadol na dose de 100mg a cada 6/6 hr. Todavia, deve-se ter cautela na prescrição de opioides para pacientes com dor crônica, devido ao maior risco de eventos adversos como náuseas, tonturas e sonolência. E ainda, constipação, quedas, fraturas e, eventualmente, drogadição.

A duloxetina, um antidepressivo dual, também pode ser utilizada em indivíduos com dores crônicas e neuropáticas, e, também, para auxiliar no tratamento de condições psicossomáticas. É mais comumente prescrito para pacientes com OA de joelhos, acometimento de múltiplas articulações e com contraindicação para o uso de AINEs. A dose inicial é de 30 a 60 mg, e a dose máxima, 120mg.

Medicações condroprotetoras

As medicações condroprotetoras são o sulfato de glucosamina, na dose de 1,5 g/dia, associado a condroitina, na dose 1,2 g/dia. E ainda, há também o extrato insaponível de soja e abacate. Todavia, há menos evidências científicas para o uso dessas drogas.

Tratamento cirúrgico

O tratamento cirúrgico é indicado quando a dor for intratável com as formas terapêuticas disponíveis, ou quando houver grande prejuízo na mobilidade do paciente. Seu objetivo é a redução das dores, minimizar a incapacidade e melhorar a qualidade de vida. Sendo a artroplastia total a terapia com melhor resultado para a osteoartrite de joelho e quadril.

Conclusão

A osteoartrite é uma doença extremamente comum, especialmente em pacientes de meia idade e idosos. Reconhecer seu padrão de acometimento articular, bem como a importância do radiografia na avaliação do acometimento das articulações, são fundamentais na prática médica. Além disso, reconhecer as principais formas de tratamento são fundamentais para o manejo desse paciente.

Leia mais: 

FONTES:

  • SHINJO, M. K., MOREIRA, C. Livro da Sociedade Brasileira de Reumatologia. 2. ed. Barueri (SP): Manole, 2021.
  • KUMAR, V., et al. Robbins Patologia Básica. 10ª ed. Rio de Janeiro (RJ): Guanabara Koogan Ltda., 2021.
  • UCHÔA, L. C., et al. Histologia Básica: Texto e Atlas. 13ª ed. Rio de Janeiro (RJ): Guanabara Koogan, 2018.

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