Cardiologia
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O que é angina estável e como reconhecê-la?

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Equipe medclub
Publicado em
20/2/2023
 · 
Atualizado em
7/5/2023
Índice

Por: Ellen Kosminsky

A angina estável é o principal sintoma da doença arterial coronariana (DAC) crônica. Sendo essa caracterizada pela presença de placas ateroscleróticas nas artérias coronarianas epicárdicas, ou seja, nas artérias descendente anterior esquerda, artéria circunflexa e na coronária direita.

Ilustração da DAC. Fonte: Boston Scientific; Link da fonte: https://www.bostonscientific.com/pt-BR/pacientes/condicoes-clinicas/doenca-arterial-coronariana.html)
Ilustração da DAC. Fonte: Boston Scientific

O que é angina estável?

A angina estável é definida pela presença de um desconforto ou dor de caráter constritivo e localização retroesternal/torácica, podendo irradiar para a face anterior do pescoço, borda interna do braço esquerdo ou ambos os braços. Além disso, a angina pode ser desencadeada por exercícios, estresse emocional e pelo frio. E mais, por relações sexuais, após refeições copiosas ou após deitar-se, devido ao aumento do retorno venoso.

Para mais, o paciente obtém alívio da dor anginosa após o repouso ou uso de nitrato sublingual, sendo esse um vasodilatador seletivo das artérias coronárias. A angina estável comumente tem duração de 2 a 5 minutos, não ultrapassando 20 minutos. Caso o indivíduo apresente a angina por tempo superior a 20 minutos, deve-se pensar num provável diagnóstico de síndrome coronariana aguda (SCA).

A dor anginosa típica pode ser indício de quais patologias?

Os sintomas anginosos ocorrem por condições que provocam diminuição do oxigênio ao miocárdio, ou por condições que aumentem a demanda de oxigênio. Assim, as principais etiologias que podem cursar com sintomas anginosos são o hipertireoidismo, a toxicidade simpaticomimética (ex: uso de cocaína), a hipertensão e a ansiedade.

Bem como a cardiomiopatia hipertrófica, a estenose aórtica e a cardiomiopatia dilatada. E ainda, a taquicardia ventricular e supraventricular. E mais, doenças como a anemia, pneumonia, asma, hipertensão pulmonar, leucemia e a estenose aórtica também podem provocar sintomas anginosos.

Quais as causas?

Como citado anteriormente, a angina estável é decorrente de um desbalanço na oferta e demanda de oxigênio (O2) do músculo cardíaco. Dessa forma, a principal causa são as placas ateroscleróticas, que podem dificultar o fluxo sanguíneo para o miocárdio em situações de maior demanda metabólica. 

A aterosclerose é uma doença inflamatória crônica da parede arterial. A artéria possui três camadas: adventícia, média e íntima. Comorbidades do paciente, como a dislipidemia e a hipertensão arterial sistêmica (HAS) irão provocar lesões nas células endoteliais da camada íntima do vaso, gerando uma reação inflamatória.

O vaso inflamado irá atuar absorvendo as lipoproteínas de baixa densidade (LDL-c) para a camada subendotelial. Após isso, os monócitos e macrófagos irão fagocitar esse lipídio e, dessa forma, formar as células espumosas. Observe a imagem abaixo.

Observe nesse corte histológico corado com hematoxilina e eosina, a presença de macrófagos com citoplasma de aspecto “espumoso”. Isso ocorre quando essa célula realiza a fagocitose do LDL-c. Fonte: Anatpat ; link da fonte: https://anatpat.unicamp.br/lamcard6.html
Observe nesse corte histológico corado com hematoxilina e eosina, a presença de macrófagos com citoplasma de aspecto “espumoso”. Isso ocorre quando essa célula realiza a fagocitose do LDL-c. Fonte: Anatpat

Após isso, as células musculares lisas, provenientes da camada média das artérias, formam placas fibróticas ao redor das células espumosas, a fim de impedir que estas entrem em contato com o lúmen do vaso. Observe a ilustração abaixo.

Ilustração comparativa entre um vaso saudável (esquerda) e um vaso com placas ateroscleróticas. Fonte: Termo Diagnose; fonte: https://termodiagnose.com.br/index.php/blog/item/27-o-endotelio-e-suas-funcoes
Ilustração comparativa entre um vaso saudável (esquerda) e um vaso com placas ateroscleróticas. Fonte: Termo Diagnose

Dessa forma, quanto maior a capa fibrótica, e menor o núcleo lipídico no interior dessa capa, mais estável será a placa aterosclerótica desse paciente. De forma análoga, quanto mais fina a capa fibrótica, e maior o núcleo lipídico, maior a probabilidade de rotura da placa aterosclerótica e, consequentemente, maior o risco de surgimento de uma SCA.

Observe este corte histológico de uma placa de ateroma. O núcleo lipídico é pequeno, e a capa fibrótica é extensa. Dessa forma, esta placa é considerada estável. Fonte: Anatpat; link da fonte: https://anatpat.unicamp.br/lamcard6.html
Observe este corte histológico de uma placa de ateroma. O núcleo lipídico é pequeno, e a capa fibrótica é extensa. Dessa forma, esta placa é considerada estável. Fonte: Anatpat

Já as placas instáveis apresentam maiores riscos de cursar com ruptura da placa, com consequente formação de trombos intramurais. Esses podem aumentar de tamanho rapidamente, ocluindo o lúmen do vaso e, dessa forma, provocando isquemia do miocárdio.

Ilustração das placas ateroscleróticas instáveis. Fonte: Robbins & Cotran: Bases Patológicas das Doenças
Ilustração das placas ateroscleróticas instáveis. Fonte: Robbins & Cotran: Bases Patológicas das Doenças

Assim, a fisiopatologia da angina estável foi, por muito tempo, atribuída a uma obstrução ≥ 50% ou mais das coronárias epicárdicas. Entretanto, com a utilização mais abrange de exames de imagem sofisticados, como a angiotomografia computadorizada, observou-que que muitos pacientes apresentam DAC mesmo sem nenhuma obstrução, especialmente indivíduos do sexo feminino.

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Fatores de risco

Diversos fatores de risco favorecem o surgimento da angina estável. Entre eles, o diabetes mellitus (DM) destaca-se como um importante fator de risco associado à doença coronariana aguda estável, aumentando consideravelmente o risco de eventos cardiovasculares em comparação com indivíduos não diabéticos. 

Isso porque aproximadamente 30% dos pacientes com DAC terão diagnóstico firmado de DM, e até 70% dos outros, quando investigados com o teste de intolerância oral à glicose (TOTG), apresentarão diagnóstico de intolerância.

Por fim, para além do diabetes, outros importantes fatores de risco são a hipertensão arterial sistêmica (HAS), o tabagismo e as doenças autoimunes, como o lúpus eritematoso sistêmico e a artrite reumatóide. E mais, o histórico familiar de doenças cardiovasculares.

Quais os sintomas da angina estável?

Como anteriormente citado, os sintomas da angina estável correspondem a dor na região precordial ou retroesternal intensa, com irradiação para membro superior esquerdo (face interna do braço). Podendo também irradiar para membro superior direito, orelha e mandíbula. Dores que acometem a região acima da orelha ou abaixo da região epigástrica são menos sugestivas da angina típica.

Além disso, a dor anginosa é intensa e de caráter constritivo. É comum o paciente apresentar a mão cerrada na região do esterno (sinal de Levi). Além disso, é muito comum a dor associada a sintomas como náuseas e vômitos.

Representação do sinal de Levi. Fonte: Liga de Cardiologia da UNICAMP; link da fonte: http://ligadecardiologiaunicamp.blogspot.com/2014/06/quais-sao-os-sintomas-que-levam-uma.html
Representação do sinal de Levi. Fonte: Liga de Cardiologia da UNICAMP

Entretanto, é importante reconhecer que, em pacientes idosos, do sexo feminino ou com demência, bem como pacientes transplantados ou portadores de DM, o quadro pode ser atípico. Por exemplo, a única manifestação da angina estável no paciente idoso pode ser o delirium.

Para mais, o exame físico do paciente costuma ser normal. Entretanto, é possível evidenciar o sinal de Frank no lóbulo da orelha, que é indicativo de coronariopatia crônica. Observe a imagem abaixo.

Sinal de Frank. Fonte: NeuroPost; link da fonte: https://www.facebook.com/neuropost/photos/se-n%C3%A3o-fosse-o-sinal-da-seta-talvez-muitos-pensariam-que-essa-imagem-seria-uma-s/2388770528026078/?paipv=0&eav=AfbgCZ_iB1QQ9fAiyIlNKEEzmureHoS6rHHrcPxndtsCPVyVCuQCZmbvVenIEw5krkw&_rdr
Sinal de Frank. Fonte: NeuroPost

Para mais, é possível classificar a gravidade da angina do paciente de acordo com a classificação da Canadian Cardiology Society (CCS). Observe a tabela abaixo:

Tabela de Forrester-Diamond para classificação da probabilidade de obstrução na DAC. Fonte: Universidade Federal do Rio de Janeiro; link da fonte: http://www.poscardio.ufrj.br/images/documentos/Tese_Doutorado_2017_Clarissa_Thiers.pdf
Tabela de Forrester-Diamond para classificação da probabilidade de obstrução na DAC. Fonte: Universidade Federal do Rio de Janeiro

Diagnóstico

O diagnóstico da DAC crônica é clínico, e é realizado no paciente que tem sintomas anginosos claros e fatores de risco relevantes. Todavia, exames complementares são importantes para a confirmação desse diagnóstico, bem como para estratificar o risco de mortalidade no paciente com sintomas anginosos típicos.

Dessa forma, ao avaliar o paciente com angina típica, deve-se solicitar o LDL-c, HDL-c e triglicerídeos (TGC). Bem como a hemoglobina glicada (HbA1c), glicemia de jejum (GJ) e função renal (uréia e creatinina). E mais, a troponina, que comumente vem sem alterações, e o BNP, a fim de avaliar possível caso de insuficiência cardíaca (IC). Por fim, solicita-se um ecocardiograma e um eletrocardiograma.

Para mais, para definir a probabilidade de existência de obstruções epicárdicas antes da realização dos exames complementares, pode-se utilizar a tabela de Forrester-Diamond. Essa tabela considera fatores como sexo, idade e se a angina é típica (estável) ou atípica (instável). Observe a tabela abaixo.

Assim, pacientes com baixa probabilidade de obstruções significativas (< 15%) não necessitam de avaliação com exames adicionais. Já pacientes com probabilidade intermediária (entre 15 e 85%) podem realizar o exame da ergometria ou da angiotomografia.

Por fim, pacientes com alta probabilidade (>85%) devem realizar a cinecoronariografia (CINE), que fornece imagens dinâmicas e permite a avaliação do coração em movimento. Por exemplo, de acordo com a tabela, um paciente do sexo masculino, com sintomas de angina típica e idade próxima dos 65 anos, apresentará entre 93 a 97% de chances de apresentar uma DAC crônica. Dessa forma, a CINE é recomendada.

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Como tratar o paciente com angina estável?

O tratamento consiste no manejo farmacológico e não farmacológico. Dessa forma, deve-se orientar o paciente sobre a importância da cessação do tabagismo, bem como a importância da realização de atividades físicas. Por fim, deve-se realizar também o manejo das comorbidades.

Tratamento farmacológico

Está indicado iniciar o uso das estatinas, independentemente do valor do LDL-c. Isso devido a propriedade que essa classe medicamentosa tem de estabilizar as placas de ateroma. E mais, orienta-se o uso de inibidores da enzima de conversão da angiotensina (IECA), por ser uma classe que comprovadamente diminui a mortalidade nestes pacientes.

Para mais, deve-se prescrever o ácido acetilsalicílico (AAS) na dose de 75 a 162 mg/dia para todos os pacientes com DAC. E ainda, orienta-se que a meta de Hb1Ac dos pacientes com DM seja < 7%.

Tratamento antianginoso

Para o tratamento antianginoso, utiliza-se os betabloqueadores (BB) como tratamento de primeira linha; dando-se preferência aos BB cardiosseletivos, como o atenolol, bisoprolol e o metoprolol. Nesses pacientes, a meta da frequência cardíaca deve ser em torno de 50 a 60 bpm.

Entretanto, caso não seja obtido o controle dos sintomas da angina apenas com betabloqueadores, ou o paciente apresente alguma contraindicação ao uso desse medicamento, orienta-se o uso de bloqueadores de canal de cálcio (BCC)

O anlodipino e o nifedipino, BCCs dihidropiridínicos, promovem vasodilatação, e podem ser associados ao BB. Entretanto, BCCs não diidropiridínicos, como o verapamil e o diltiazem, não devem ser associados aos BB, visto que diminuem a FC.

Para mais, são indicados também os nitratos de ação rápida para combate dos sintomas anginosos. Sendo o dinitrato de isossorbida (isordil) utilizado para alívio rápido da sintomatologia anginosa. 

Entretanto, deve-se ter cuidado ao administrar nitratos com medicamentos inibidores da fosfodiesterase, como o viagra, comumente utilizados em pacientes com DAC devido ao quadro de disfunção erétil. Isso porque o uso concomitante desses medicamentos pode provocar hipotensão no paciente.

Observe o esquema abaixo para o tratamento da angina estável. Caso o paciente não apresente melhora do quadro clínico de angina, mesmo após utilização do alopurinol, medicação de 4ª linha, deve-se considerar a realização do cateterismo.

Esquema para tratamento da angina estável. Fonte: Livro-texto da sociedade brasileira de cardiologia, 2021
Esquema para tratamento da angina estável. Fonte: Livro-texto da sociedade brasileira de cardiologia, 2021

Conclusão

A angina estável é uma condição muito comum. O seu reconhecimento, bem como sua diferenciação da angina instável e dos sintomas da síndrome coronariana aguda são de fundamental importância para o médico generalista. Dessa forma, reconhecer o quadro clínico, formas de diagnóstico e seu tratamento é crucial na prática médica!

Continue aprendendo:

FONTES:

  • FILHO, A. A. F., et al. Livro-texto da sociedade brasileira de cardiologia. 3ª ed. Barueri [SP]: Manole, 2021.
  • MAHLER, S. A. Angina pectoris: Chest pain caused by fixed epicardial coronary artery obstruction. UpToDate. 2023. Acesso em: 15/02/2023. Disponível em:
  • KUMAR, V. et al. Bases Patológicas das Doenças. Rio de Janeiro: Elsevier, 2016

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