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Hepatites virais: causa, tipos, sintomas e tratamento

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Equipe medclub
Publicado em
6/11/2023
 · 
Atualizado em
6/11/2023
Índice

De 2000 a 2021, foram notificados 718.651 casos confirmados de hepatites virais no Brasil. Anualmente, mais de 1 milhão de pessoas morrem no mundo pela doença. O termo hepatite designa uma inflamação do fígado, sendo uma das causas mais frequentes as infecções virais. Mas quais os tipos de hepatites virais mais comuns?

As infecções mais comuns são causadas pelos vírus tipo A na infância e tipo B no adulto. A hepatite é dividida ainda em aguda e crônica (> 6 meses). Em casos crônicos,  pode levar a danos hepáticos irreversíveis, como fibrose e cirrose, além de aumentar o risco de câncer.

O que causa hepatite?

A causa mais comum de hepatite é a viral, no entanto, a doença também pode ser decorrente do abuso de álcool ou outras substâncias tóxicas. Enquanto os vírus atacam o fígado durante sua reprodução, a cirrose dos alcoólatras é causada pelos ácidos nocivos nas células hepáticas, formados a partir do álcool. 

Quais os tipos de hepatites?

Hepatite A e E

O vírus da hepatite A (HAV) é uma molécula de RNA, cuja transmissão é dada principalmente por via fecal-oral através do contato pessoa a pessoa ou ingestão de alimentos ou água contaminados. Mundialmente, a evidência sorológica de infecção prévia é bastante alta. No entanto, a sua prevalência apresenta relação com a condição socioeconômica e do acesso à água potável de cada local.

O vírus da hepatite E (HEV) possui 8 genótipos conhecidos, sendo a sua transmissão também por via fecal-oral (genótipos 1 e 2) ou por transmissão zoonótica, associada à ingestão de carne crua ou mal cozida (genótipos 3 e 4).

Hepatite B

O vírus da hepatite B (HBV) é um patógeno de DNA, cuja transmissão é efetuada através da exposição a sangue ou fluidos corporais infectados, mais comumente por uso de drogas intravenosas, contato sexual ou transmissão vertical de mãe para filho.

A idade da infecção pelo VHB é o principal fator que determina o curso desse tipo de hepatite viral. Pacientes infectados no período perinatal geralmente desenvolvem hepatite B crônica, enquanto a maioria dos adultos infectados elimina rapidamente o vírus.

A sua intensidade depende da resposta imune do hospedeiro, sendo uma doença subclínica em aproximadamente 2/3 dos casos, enquanto o outro 1/3 desenvolve hepatite sintomática e 1% desenvolve insuficiência hepática aguda, com taxas de sobrevivência de apenas 20%.

Hepatite C

O vírus da hepatite C (HCV) é responsável por afetar cerca de 3% da população mundial. Sua transmissão é feita através da inoculação direta na corrente sanguínea, mais comumente por uso de drogas intravenosas e transfusões de sangue contaminado. Cerca de 75% desses pacientes evoluem com hepatite crônica, ocasionando fibrose avançada e cirrose se não for tratada. 

Os fatores que contribuem para a progressão crônica do HCV para cirrose incluem idade avançada, HBV concomitante, uso contínuo de álcool, estados imunocomprometidos e fatores de risco para esteatose não alcoólica, incluindo obesidade e resistência à insulina.

Hepatite D

O vírus da hepatite D (HDV) é um microrganismo RNA defectivo que necessita da função do vírus B (HBV) para a sua sobrevivência e disseminação. Na Amazônia, a coinfecção HDV + HBV é endêmica. De modo geral, a infecção pelo HDV parece estar ligada à exposição percutânea, hemotransfusão e aos usuários de drogas IV – com este último grupo respondendo pela maioria dos casos em áreas não endêmicas. 

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Sintomas de Hepatite

Em geral, o curso clínico das hepatites virais agudas é característico e se desenrola de forma estereotipada ao longo de três fases sucessivas: prodrômica, ictérica e convalescência. Na fase prodrômica predominam sintomas sistêmicos e gastrointestinais inespecíficos: mal-estar, astenia, anorexia, náuseas, vômitos, diarreia, artralgias, mialgias, tosse, coriza, cefaleia e fotofobia.

Após um período de vários dias a poucas semanas, inicia-se fase ictérica, caracterizada pelo surgimento de icterícia, associada ou não a síndrome colestática (colúria, hipocolia fecal e prurido). A fase de convalescência é marcada clinicamente pela percepção, por parte do paciente, da melhora dos sinais e sintomas desenvolvidos nas fases anteriores.

Hepatite A

O período de incubação deste tipo de hepatite viral é de 4 a 5 meses e a infecção é caracteristicamente assintomática em crianças menores de 6 anos e sintomática em crianças mais velhas e adultos. Menos de 10% das crianças menores desenvolvem icterícia com infecção por HAV, e a única evidência de infecção é a presença sorológica de anticorpos anti-HAV.  

Os sintomas da hepatite são decorrentes de um dano hepático imuno mediado, ocasionando sintomas inespecíficos como febre, mal-estar, fadiga e perda de apetite seguidos de icterícia em aproximadamente 70% dos pacientes.

Cerca de 60% dos indivíduos se recuperam em 2 meses, e dentre aqueles que desenvolvem alguma colestase prolongada ou recidiva, quase 100% se recuperam em até 6 meses do início da doença. Dessa forma, seu quadro é, geralmente, autolimitado. Menos de 1% desenvolvem insuficiência hepática.

Hepatite E

A infecção por HEV é frequentemente assintomática, mas quando sintomática, apresenta sintomas semelhantes a outras hepatites agudas, como fadiga, náusea, vômito e anorexia, sendo um quadro bem autolimitado. Em casos graves, pode levar à insuficiência hepática fulminante, especialmente em mulheres grávidas. A infecção crônica por HEV foi observada em pacientes imunocomprometidos e pode levar ao desenvolvimento de cirrose e câncer hepático.

Hepatite B

As manifestações clínicas da hepatite B dependem da forma evolutiva adotada pela hepatite. Em geral, quando aguda, os sintomas costumam ser mais intensos se comparados com os da hepatite A ou C. Mas, quais os tipos de hepatite B?  A infecção pelo HBV pode se apresentar de cinco formas:

  • Assintomática: apenas o aumento das aminotransferases e dos marcadores sorológicos.
  • Anictérica: apenas sintomas da fase prodrômica simulando uma "gripe" associada a aminotransferases acima de 500 U/L. 
  • Ictérica: icterícia clássica de fácil diagnóstico.
  • Recorrente/recrudescente: É caracterizada em termos laboratoriais pela ocorrência de novos aumentos das aminotransferases em pacientes que já haviam experimentado uma melhora e normalização dessas enzimas (recorrente), ou em pacientes que estavam prestes a atingir esse estado de melhora (recrudescente).
  • Colestática: intensa acolia fecal e prurido, associado ao aumento progressivo da bilirrubina direta, fosfatase alcalina e gama GT. 

As principais manifestações extra-hepáticas são: poliartrite nodosa, glomerulonefrite, acrodermatite granular, mononeurite, mielite, síndrome de Guillain-Barré, púrpura de Henoch-Schönlein (em crianças), pericardite e pleurite.

Hepatite D

O HDV pode infectar o indivíduo de forma simultânea com o HBV (Coinfecção) ou então infectar alguém já cronicamente infectado pelo HBV (Superinfecção), aumentando consideravelmente o risco de hepatite fulminante em até 20%. A dependência deste tipo de hepatite viral em relação ao HBV é tão grande que a duração da infecção do primeiro nunca ultrapassa a duração da infecção deste último. 

Hepatite C

Cerca de 80% dos casos de hepatite C aguda são assintomáticos. O HCV crônico também é amplamente assintomático antes do desenvolvimento de fibrose avançada. Quando presentes, os sintomas de hepatite C em nada diferem das demais formas de hepatites virais agudas (prodrômica, ictérica e convalescência), sendo rara a evolução para hepatite fulminante. 

Diagnóstico

Hepatite A

O diagnóstico depende da presença de anticorpos anti-HAV-IgM, o qual surge algumas semanas após a exposição e início dos sintomas, e se torna indetectável após 1 ano do quadro. Anticorpos anti-HAV-IgG também estão presentes no início dos sintomas, mas diferente do anti-HAV-IgM, fica presente por toda a vida do paciente, conferindo-o imunidade vitalícia.

Hepatite B e D

O antígeno de superfície da hepatite B (HBsAg) é a marca sorológica da infecção pelo HBV. Já o antígeno central da hepatite B (HBcAg) é um antígeno intracelular expresso em hepatócitos infectados, não sendo detectável no soro.

O anti-HBc pode ser detectado durante todo o curso da hepatite viral do tipo B, enquanto o antígeno da hepatite B (HBeAg) é uma proteína secretora que é processada a partir da proteína pré-núcleo, sendo considerado um marcador de replicação e infectividade do vírus.

Fonte: Uptodate
Fonte: Uptodate

O diagnóstico de hepatite B aguda baseia-se na detecção de HBsAg e IgM anti-HBc. A infecção prévia pelo HBV é caracterizada pela presença de anti-HBs e IgG anti-HBc. A imunidade à infecção pelo VHB após a vacinação é indicada apenas pela presença de anti-HBs.

Caso presente, o diagnóstico de infecção pelo HDV é feito por meio da pesquisa do anti-HDV (IgM e IgG). Em muitos lugares, infelizmente, só é possível dosar o anti-HDV total, devendo ser interpretado segundo o quadro a seguir.

Formas HbsAg Anti-HBc Total Anti-HBc IgM Anti-HDV Total Anti-HBs
Coinfecção + + + + * -
Superinfecção + + - +** -
Cura - + - +** +
*Elevação à custa de IgM e IgG; ** Elevação à custa de IgG, somente. Interpretação de diagnóstico conjunto da HBV e HDV. Fonte: Uptodade

Hepatite C

Habitualmente, a hepatite C é descoberta em sua fase crônica. O primeiro teste a ser feito é o anti-HCV, o qual descarta a doença se o resultado for negativo. Caso positivo, realiza-se o teste molecular HCV-RNA para a confirmação. Sendo este positivo, o diagnóstico é confirmado. Caso negativo, deve-se repetir o exame após três e seis meses.

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Como tratar?

Hepatite A e E

O tratamento é principalmente preventivo, com vacinação antes de possíveis exposições. No Brasil, a prevenção é feita com uma dose de vírus inativo aos 15 meses de vida. Apesar disso, o tratamento para o HAV é geralmente favorável com recuperação espontânea. Embora não exista tratamento antiviral, alguns estudos investigaram a profilaxia pós-exposição com imunidade ativa se utilizando da vacinação contra o HAV e conferindo imunidade passiva através de infusões de imunoglobulina contra o HAV.

Nos Estados Unidos é recomendada a vacina contra o HAV ou a imunoglobulina contra o HAV para profilaxia pós-exposição dentro de 2 semanas; entretanto, o imunizante tem uma vantagem sobre a imunoglobulina, incluindo imunidade ativa e maior duração de ação.

No momento, não existe tratamento antiviral direto para o HEV. O tratamento da hepatite E crônica envolve a redução da imunossupressão em pacientes imunocomprometidos. Quando a diminuição da imunossupressão não é possível ou não é eficaz, a ribavirina é a principal opção terapêutica. No entanto, ela é contraindicada em mulheres grávidas. 

Hepatite B e D

Os medicamentos antivirais disponíveis contra o VHB são regimes baseados em inibidores de transcriptase reversa de nucleotídeos/nucleosídeos (NRTIs). Os NRTIs de primeira geração sofriam de baixas barreiras à resistência viral e foram substituídos por NRTIs de segunda geração (entecavir e tenofovir), podendo atingir negatividade do DNA do VHB em 70% a 85% dos pacientes e soroconversão do antígeno-e em 20% e 25% dos pacientes após 1 ano de tratamento.

Apesar disso, aproximadamente 30% apresenta recidiva do VHB após 5 anos, o que levou a uma terapia prolongada mesmo após a soroconversão do antígeno e para diminuir o risco de reativação. Por isso, o acompanhamento deve ser realizado idealmente a cada 6 meses para avaliação de carcinoma hepatocelular.

Em casos de associação HDV + HBV, todos os pacientes devem iniciar o tratamento com a combinação de alfapeginterferona + tenofovir ou entecavir por 48 semanas. Após esse período a alfapeginterferona é suspensa e as medicações orais são mantidas indefinidamente.

Em suma, o método mais promissor para a prevenção de infecções primárias pelo VHB é a vacinação precoce e universal. No Brasil, a vacina contra o VHB é dada em 4 momentos: logo ao nascimento + três doses subsequentes aos 2, 4 e 6 meses de vida incluídas no esquema da pentavalente.

Hepatite C

No Brasil, o tratamento antiviral específico está indicado para todo portador do HCV na fase aguda ou crônica, na ausência de contraindicação medicamentosa. Para isso, é preciso estratificar o estágio em que a doença se encontra, pois a existência de fibrose avançada (Metavir F3) ou cirrose (Metavir F4) modifica o esquema terapêutico. 

A avaliação do estágio da hepatopatia crônica pode ser feita por meio de escores como o APRI e o FIB4, a elastografia hepática (por USG ou RM) ou mesmo a biópsia hepática (padrão-ouro). O protocolo clínico do Ministério da Saúde recomenda os escores APRI e FIB4 como métodos de escolha para avaliação do estágio da doença hepática na hepatite C crônica, por sua praticidade, disponibilidade e boa especificidade.

Fonte: Ministério da Saúde; link da fonte: https://www.hepato.com/antigo/wk/pcdt.pdf
Fonte: Ministério da Saúde

Conclusão

As hepatites são um grupo de doenças inflamatórias do fígado, com diversas causas, sendo as mais comuns as hepatites virais A, B e C. Elas podem variar na gravidade, indo desde infecções agudas autolimitadas até casos crônicos que podem levar a complicações graves, como cirrose e câncer hepático, sendo o diagnóstico e tratamento precoce estimulados.

Dessa forma, a prevenção com a vacinação disponível para hepatites A e B é fundamental, assim como medidas de higiene e segurança em relação ao sangue e fluidos corporais para evitar a transmissão. 

Continue aprendendo:

FONTES: 

  • Odenwald MA, Paul S. Viral hepatitis: Past, present, and future. World J Gastroenterol. 2022 Apr 14;28(14):1405-1429. doi: 10.3748/wjg.v28.i14.1405. PMID: 35582678; PMCID: PMC9048475.
  • Hepatitis B virus: Overview of management - UpToDate 

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