A enxaqueca, também conhecida como migrânea, é a segunda cefaleia primária mais comum, precedida apenas da cefaleia do tipo tensional. De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), a migrânea está entre as 20 principais causas de incapacidade no mundo, e a maioria dos pacientes com cefaleia incapacitante são portadores da enxaqueca.
A migrânea acomete cerca de 12% da população, sendo mais predominante em mulheres. Além disso, estima-se que um terço dos encaminhamentos ao neurologista por vertigem ou tontura apresentem um diagnóstico primário de enxaqueca, o que enfatiza sua alta prevalência e possíveis desafios diagnósticos.
Quais as causas?
O cérebro na enxaqueca é particularmente sensível a estímulos sensoriais e ambientais. Assim, a crise pode ser iniciada ou amplificada por diversos fatores, entre eles, luzes brilhantes, sons e odores. E ainda, por fome, estresse e esforço físico. E mais, flutuações hormonais durante a menstruação, e pela falta ou excesso de sono.
Dessa forma, a identificação precoce desses fatores desencadeantes é fundamental, visto que pode ser útil para orientar mudanças no estilo de vida e no plano de tratamento do paciente.
Sintomas da enxaqueca
As principais formas são a enxaqueca com e sem aura, a enxaqueca episódica e a crônica. A aura está presente em 25% dos pacientes, e muitas vezes se apresenta como distúrbios visuais através de luzes tremulantes ou linhas em zigue-zague que se movimentam através do campo visual.
Entretanto, para além dos sintomas visuais da aura, essa também pode exibir sintomas provinientes do tronco encefálico, são eles a diplopia, a ataxia e a alteração de consciência. E ainda, a disartria, o zumbido e a vertigem.
Para firmar o diagnóstico, o paciente deve ter crises repetidas de cefaleia com duração entre 4 e 72 horas, apresentando um exame físico normal. Além disso, deve queixar-se de ao menos duas das seguintes características: 1) dor unilateral; 2) dor em caráter pulsátil; 3) agravamento com o movimento; e 4) intensidade moderada a forte.
E mais, deve apresentar ao menos uma das seguintes características: 1) náuseas e/ou vômitos, e; 2) fotofobia e fonofobia. Por fim, enxaqueca com episódios que ocorrem 15 dias ou mais por mês é definida como crônica.
Diagnóstico de enxaqueca sem aura. Fonte: MedicinaNET
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Como realizar o tratamento?
Após o estabelecimento do diagnóstico, é fundamental a avaliação da extensão da doença e do comprometimento do nível funcional do paciente. O Migraine Disability Assessment Test (MIDAS), um escore de avaliação de incapacidade da enxaqueca, pode ser utilizado para essa avaliação. Veja a seguir:
Para além dessa ferramenta, o diário de cefaleia também é uma ferramenta útil na avaliação da incapacidade do paciente, bem como para avaliar a frequência do uso de medicações abortivas. Veja o exemplo abaixo:
Para mais, apesar da enxaqueca não ser uma doença “curável”, é importante ressaltar para o paciente que ela pode ser modificada e controlada por meio das mudanças de estilo de vida (tratamento não farmacológico), bem como pelo uso de medicamentos (tratamento farmacológico).
Além disso, é importante tranquilizá-lo em relação ao fato de que, em geral, o problema não é associado a doenças graves e que comportam risco à vida.
Tratamento não farmacológico
Diversas recomendações de mudanças de comportamento podem auxiliar no controle. Dessa forma, é importante orientar o paciente a adotar uma dieta saudável e com horários regulares para a alimentação. Além disso, a realização de exercícios físicos, bem como padrões rotineiros de sono.
E mais, evitar o consumo excessivo de cafeína e de álcool, reduzir ao máximo as alterações agudas nos níveis de estresse - através de atividades como o yoga e a meditação, por exemplo - ajudam no controle da enxaqueca. Para mais, evitar os fatores deflagrantes da crise, citados anteriormente neste texto, também são medidas cabíveis durante o tratamento.
Tratamento farmacológico
Caso essas medidas de mudança de estilo de vida não sejam capazes de evitar as crises, haverá necessidade da inserção do tratamento farmacológico.
Fármacos anti-inflamatórios não esteroides (AINEs)
FÁRMACOS ANTI-INFLAMATÓRIOS NÃO ESTEROIDES (AINEs)
FÁRMACO
NOME COMERCIAL
DOSE
Naproxeno
Aleve, Anaprox, genérico
220 a 550 mg VO, 2 vezes/dia
Ibuprofeno
Advil, Motrin, Nuprin, genérico
400 a 800 mg VO a cada 6 a 8 h
Ácido acetilsalicílico
Aspirina, genérico
500 a 1.000 mg VO, 2 vezes/dia
Ácido tolfenâmico
Clotam Rapid
200 mg VO, pode se repetir a dose uma vez depois de 1 a 2 horas
Diclofenaco potássico
Cambia, genérico
50 mg VO com água
Os AINEs podem reduzir significativamente a gravidade e a duração de uma crise de enxaqueca, e são mais efetivos quando tomados no início. Entretanto, isoladamente, podem não ser capazes de abortar por completo a crise de migrânea moderada a grave. E mais, são efeitos colaterais importantes dos AINEs a dispepsia, a irritação gastrointestinal, e os potenciais efeitos cardiovasculares e renais.
Agonistas dos receptores de 5-hidroxitriptamina (triptanas)
TRIPTANAS
FÁRMACO
NOME COMERCIAL
DOSE
Oral
Naratriptana
Emerge
Comprimido de 2,5 mg no início; pode-se repetir uma vez depois de 4 h
Rizatriptana
Maxalt Maxalt-MLT
Comprimido de 5 a 10 mg no início; pode-se repetir depois de 2 h (máximo de 30 mg/dia)
Sumatriptana
Imitrex
Comprimido de 50 a 100 mg no início; pode-se repetir depois de 2 h (máximo de 200 mg/dia)
Frovatriptana
Frova
Comprimido de 2,5 mg no início; pode-se repetir depois de 2 h (máximo de 25 mg/dia)
Almotriptana
Axert
Comprimido de 20 a 40 mg no início (máx. de 80 mg/dia)
Zolmitriptana
Zomig, Zomig Rapimelt
Comprimido de 2,5 a 5 mg no início; pode-se repetir depois de 2 h (máximo de 10 mg/dia)
Nasal
Di-hidroergotamina
Migranal Nasal Spray
Antes do spray nasal, a bomba precisa ser preenchida quatro vezes; administra-se um spray (0,5 mg), seguido de um segundo spray em 15 min
Sumatriptana
Imitrex Nasal Spray
Spray intranasal de 5 a 20 mg, em 4 sprays de 5 mg ou um único spray de 20 mg (pode-se repetir uma vez depois de 2 h, sem ultrapassar a dose de 40 mg/dia)
Zolmitriptana
Zomig
Spray intranasal de 2,5 a 5 mg de um spay (pode-se repetir uma vez depois de 2 h, sem ultrapassar uma dose de 10 mg/dia)
Parenteral
Di-hidroergotamina
DHE-45
1 mg IV ou SC no início e a cada 1 h (máximo de 3 mg/dia, 6 mg/semana)
A estimulação dos receptores de 5-hidroxitriptamina (5-HT1B/1D) podem abortar as crises agudas, sendo as triptanas agonistas seletivas desses receptores. Já a ergotamina e a di-hidroergotamina são agonistas não seletivos.
Entretanto, a monoterapia com triptanas orais não produz alívio rápido, consistente e completo em todos os indivíduos. Além disso, essas medicações podem não ser tão efetivas naqueles que são portadores de migrânea com aura. Dessa forma, a administração da triptana com um AINE de ação mais longa, como o naproxeno, pode aumentar o efeito inicial da sumatriptana, reduzindo assim as taxas de recidiva da cefaleia.
Ademais, são efeitos colaterais das triptanas a náusea, sensação de constrição do tórax, tontura, astenia e rubor. É preciso lembrar também que essas medicações são contraindicadas em pacientes com história prévia de doenças cardiovasculares e/ou vasculares encefálicas.
Antagonistas dos receptores dopaminérgicos
ANTAGONISTAS DOS RECEPTORES DOPAMINÉRGICOS
FÁRMACO
NOME COMERCIAL
DOSE
Oral
Metoclopramida
Reglan
5 a 10 mg/dia
Proclorperazina
Compazine
1 a 25 mg/dia
Prometazina
Phernegan
25/50 mg/dia
Clorpromazina
Thorazine
25 a 50 mg/dia
Parenteral
Metoclopramida
Reglan
10 mg IV
Proclorperazina
Compazine
10 mg IV
Clorpromazina
Thorazine
12,5 a 25 mg IM ou IV (0,1 mg/kg IV, 2 mg/min)
Prometazina
Phernegan
12,5 a 25 mg IM ou IV (lentamente)
Tabela com medicamentos antagonistas dos receptores dopaminérgicos para tratamento da enxaqueca aguda. Fonte: Merrit Tratado de Neurologia, 2018
A administração de antagonistas dos receptores dopaminérgicos, por via oral ou parenteral, pode ser utilizada como tratamento auxiliar na migrânea. Isso porque a absorção gastrointestinal de fármacos como a sumatriptana e os AINEs é prejudicada durante o episódio agudo da disfunção, independentemente do paciente apresentar náuseas ou não.
Dessa forma, a administração de antagonistas dos receptores dopaminérgicos, como a metoclopramida em 10 mg, pode aumentar a absorção gástrica desses medicamentos e diminuir os sintomas de náuseas e vômitos.
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Opióides
Os opióides costumam ser administrados nos departamentos de emergência, e atuam diminuindo a dor ou eliminando-a. Entretanto, não tratam a fisiopatologia subjacente da cefaléia, e há evidência de que o uso contínuo desses medicamentos pode tornar outros fármacos utilizados no tratamento, como as triptanas, menos efetivas.
Além disso, o uso frequente de opióides pode resultar em cefaleias por uso excessivo de medicação, bem como levar a dependência física e a drogadição. E mais, a fissura e/ou abstinência também pode agravar as crises.
Tratamento preventivo para a migrânea
Em geral, recomenda-se considerar o tratamento preventivo em pacientes com ≥4 crises/mês. Entretanto, a decisão de iniciar a medicação preventiva também deve considerar a gravidade e a duração das crises. Assim, pessoas que exibem uma frequência crescente das crises e aquelas que não respondem adequadamente às medicações abortivas, são candidatos para iniciar a profilaxia.
Entretanto, o medicamento demora, em geral, 2 a 12 semanas para que se possa observar algum efeito. Devido aos efeitos colaterais significativos, frequentemente inicia-se a medicação em uma dose baixa, aumentando-a gradualmente até que se observem os efeitos clínicos desejados.
Observe a tabela abaixo com os fármacos disponíveis para a profilaxia. A taxa de sucesso de qualquer um desses medicamentos é em torno de 50 a 70%. Para mais, ele deve ser mantido por 6 a 12 semanase, em seguida, a dose deve ser lentamente reduzida, a fim de avaliar se há necessidade de sua continuação.
Sonolência, cãibras nas pernas, queda de cabelo, fibrose retroperitoneal
Outras classes
Flunarizina (bloqueador de canal de cálcio)
5 a 15 mg, 1 vez/dia
Sonolência, ganho de peso, depressão, parkinsonismo
Candesartana (inibidor BRA)
16 mg, 1 vez/dia
Tontura, hipotensão
Toxina onabotulínica tipo A (botox)
155 unidades divididas em 31 locais
Perda do sulco da frontose, ptose, dor nos locais da injeção, rigidez do pescoço
Tabela com medicamentos antagonistas dos receptores dopaminérgicos para tratamento da enxaqueca aguda. Fonte: Merrit Tratado de Neurologia, 2018
Conclusão
A enxaqueca é a principal causa de consulta ao neurologista. Sua prevalência, bem como sua capacidade de causar grande comprometimento funcional no paciente são inquestionáveis. Por isso, saber diagnosticá-la bem como reconhecer suas formas de tratamento ambulatorial e na emergência, são imprescindíveis para o médico generalista.
KOWACS, Fernando. Et al. Classificação Internacional das Cefaleias / Comitê de Classificação das Cefaleias da Sociedade Internacional de Cefaleia. 3ª ed. São Paulo: Omnifarma, 2018.
LOUIS, E. D., MAYER, P. L. Merritt Tratado de Neurologia. 13ª ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2018.
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