Medicina de Emergência
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Abdome agudo obstrutivo: o que é, causas e tratamento

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Equipe medclub
Publicado em
17/4/2023
 · 
Atualizado em
7/5/2023
Índice

Por: Ellen Kosminsky

O abdome agudo obstrutivo é uma causa potencialmente fatal de dor abdominal. Tem como média de incidência 64 anos, e 60% desses pacientes são do sexo feminino. Além disso, o intestino delgado é o órgão afetado em aproximadamente 75% dos casos de obstrução intestinal. E mais, para além do abdome agudo obstrutivo, existem outros quatro tipos de abdome agudo: inflamatório, hemorrágico, perfurativo e vascular. 

O que é abdome agudo obstrutivo?

Esta é uma síndrome na qual há uma parada ou retardo significativo da progressão do conteúdo gastrointestinal. Assim, esse não consegue progredir até o reto, impossibilitando a eliminação pelo organismo.

Pode ser classificado em uma obstrução intestinal alta ou baixa. A obstrução alta ocorre acima do ângulo de Treitz. Já a obstrução intestinal baixa ocorre abaixo deste ângulo. Além disso, o abdome agudo obstrutivo pode ser também classificado em mecânico ou funcional.

Ligamento de Treitz. Fonte: Eu Médico Residente; link da fonte: ttps://www.eumedicoresidente.com.br/post/esofago-de-barrett
Ligamento de Treitz. Fonte: Eu Médico Residente

A obstrução mecânica pode ser classificada de acordo com a localização do processo oclusivo. Assim, pode acometer a região intraluminal, da parede intestinal e extraintestinal. No intestino delgado, cerca de 80% das obstruções intestinais tem causa mecânica.

Causas do abdome agudo obstrutivo

As principais etiologias da obstrução alta são as bridas e as hérnias. Já na obstrução baixa, destacam-se o volvo e os tumores. Abaixo, encontra-se uma tabela com as principais causas de obstrução intestinal mecânica, de acordo com sua localização em relação à alça.


Assim, os principais fatores de risco para a obstrução intestinal são as cirurgias abdominais ou pélvicas, as hérnias inguinais ou abdominais e as doenças inflamatórias intestinais. E mais, a história ou risco aumentado para as neoplasias, radioterapia prévia e história de ingestão de corpo estranho.

As neoplasias são importantes causas de obstrução intraluminal. Sendo a causa mais comum de obstrução do intestino grosso o adenocarcinoma de cólon. Já a intussuscepção, uma obstrução mecânica da parede intestinal, é mais comum em crianças.

Nas lesões extraintestinal, as bridas destacam-se como a principal causa de obstruções no adulto, e ocorrem com maior frequência nas cirurgias de andar inferior do abdome. Para mais, hérnias externas também são passíveis de causar obstruções.

Já a obstrução funcional tem como principal causa o íleo paralítico. Sendo esse caracterizado pela parada de eliminação de gases e fezes na ausência de uma oclusão. Pode estar associado a náuseas, vômitos, distensão abdominal e dor difusa. E ainda, a peristalse e os ruídos abdominais estão comumente diminuídos ou ausentes.

São causas importantes de íleo paralítico as laparotomias, os distúrbios hidroeletrolíticos, o uso de drogas, os processos inflamatórios intra-abdominais, hemorragias retroperitoneais, a isquemia intestinal e a sepse.

Quais são os sintomas?

São importantes sinais do abdome agudo obstrutivo a presença do abdome distendido e timpânico. Isso ocorre devido ao acúmulo de gás engolido pelo indivíduo, bem como pelos gases produzidos pela fermentação bacteriana no conteúdo luminal estagnado. 

Além disso, a presença de vômitos - mais frequente nas obstruções do duodeno e jejuno proximal - é um sinal cardinal para a obstrução intestinal. Quando a obstrução for proximal, é possível que a desidratação seja acompanhada de hipocloremia, hipocalcemia e alcalose metabólica, secundários aos vômitos contendo suco gástrico. Por fim, a ausência de fezes e/ou flatos são também importantes sinais cardinais.

A obstrução intestinal aguda é também caracterizada pela presença de ruídos hidroaéreos de alta frequência, denominados de “sons metálicos”. Esses ocorrem porque, com a obstrução da alça, essa perde progressivamente sua capacidade de absorção, cursando com acúmulo de líquido e, consequentemente, aumento da pressão hidrostática, provocando as peristalses reflexas.

Para mais, a presença da dor em cólica, tipicamente em região periumbilical, também é um sintoma comum. Ocorre em intervalos de 4 a 5 minutos, devido a peristalse da alça “empurrando” o conteúdo intraluminal. E mais, varia de acordo com o local e a duração da obstrução (se proximal ou distal), bem como com o grau da obstrução (se parcial ou completa).

Caso haja uma progressão da dor em cólica para uma dor bem localizada e constante, é preciso considerar a possibilidade de irritação peritoneal secundária à necrose de alça. Isso porque, à medida que a obstrução se torna mais grave, há um aumento da compressão dos ductos linfáticos e das vênulas da mucosa da alça, reduzindo sua função de absorção.

Assim, esse quadro de estase venosa e o aumento da pressão hidrostática mencionada anteriormente podem provocar redução da perfusão da parede. E ainda, em caso de progressão para uma dor abdominal severa, deve-se considerar a possibilidade de perfuração de alça.

Além disso, taquicardia e hipotensão, quando presentes, devem levantar suspeita de desidratação, que pode ocorrer devido ao quadro de perda de líquidos para o terceiro espaço na região da alça. Por fim, com a progressão do quadro de obstrução, as alças vão tornando-se hipoativas, e os ruídos hidroaéreos irão cessar, até completa parada do peristaltismo.

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Como realizar o diagnóstico?

O diagnóstico do abdome agudo obstrutivo é clínico-radiológico. Assim, deve-se questionar ao paciente quanto a sua idade, o tempo de início do quadro e a característica da dor. Bem como se há presença de flatos e/ou fezes, se ele realizou alguma cirurgia prévia, e se houve perda de peso associada.

Para mais, é preciso perguntar se há presença de vômitos. Caso sejam frequentes e biliares, a hipótese diagnóstica deve ser direcionada para uma obstrução alta. Se apresentaram início tardio - após a distensão abdominal - e são fecalóides, a principal hipótese é de uma obstrução baixa. O toque retal também é fundamental, e visa observar a presença de possíveis fecalomas na ampola retal, fezes no dedo de luva e massas intraluminais.

Além da história clínica do paciente, deve-se solicitar exames laboratoriais: hemograma completo, PCR e eletrólitos, uréia e creatinina. Esses parâmetros irão auxiliar na avaliação de gravidade, hipovolemia, leucocitose e anormalidades metabólicas. Além disso, sendo evidenciado um quadro de gravidade, deve-se colher uma gasometria arterial.

Para mais, em caso de suspeita de abdome agudo obstrutivo solicita-se um raio-X de abdome em pé e deitado e um raio-X de tórax em pé. Esse último visa identificar possível pneumoperitônio (sinal do crescente), decorrente de ruptura de alças, que indica necessidade de abordagem cirúrgica imediata.

Raio-X de abdome com presença de nível hidroaéreo. Fonte: ResearchGate; link da fonte: https://www.researchgate.net/figure/Foto-1-Radiografia-de-abdomen-Niveles-hidroaereos_fig1_331062175
Raio-X de abdome com presença de nível hidroaéreo. Fonte: ResearchGate

Para além desse achado, também é possível evidenciar no raio-X de abdome do paciente com abdome agudo obstrutivo a presença de nível hidroaéreo e aumento da espessura das alças com presença de haustrações. E ainda, na presença de uma obstrução total, haverá ausência de gás nos cólons e no reto.

Raio-X de abdome com dilatação das alças do intestino delgado. Perceba a ausência de gás no intestino grosso. Fonte: Unicamp; link da fonte: https://drpixel.fcm.unicamp.br/conteudo/abd%C3%B4men-agudo-obstrutivo-p%C3%B3s-operat%C3%B3rio
Raio-X de abdome com dilatação das alças do intestino delgado. Perceba a ausência de gás no intestino grosso. Fonte: Unicamp

Por fim, no paciente com volvo de sigmóide, é possível observar o sinal do “U invertido”, também conhecido como sinal do “grão de café”. E mais, apesar do uso do contraste não ser realizado de rotina no raio-X do paciente com obstrução intestinal, na presença de volvo sigmóide, pode ser possível observar o sinal do “bico de pássaro”.

Sinal do U invertido. Fonte: Revista Médica de Minas Gerais; link da fonte: https://rmmg.org/artigo/detalhes/72
Sinal do U invertido. Fonte: Revista Médica de Minas Gerais
Raio-X de abdome com enema opaco, evidenciando o sinal do “bico de pássaro”. Fonte: Hospital Federal Cardoso Fontes; link da fonte: https://slideplayer.com.br/slide/1776362/
Raio-X de abdome com enema opaco, evidenciando o sinal do “bico de pássaro”. Fonte: Hospital Federal Cardoso Fontes

Para mais, caso o raio-X não evidencie achados que indiquem intervenção cirúrgica imediata, recomenda-se a realização de uma tomografia computadorizada (TC) de abdome, a fim de avaliar o local em que está ocorrendo a obstrução. São achados que devem elevar as suspeitas de obstrução quando houver presença de nível hidroaéreo e dilatação das vísceras.

TC de abdome sem contraste, corte axial, evidenciando dilatação de alças intestinais e nível hidroaéreo. Fonte: Radiologia Brasileira; link da fonte: http://www.rb.org.br/detalhe_artigo.asp?id=1505&idioma=Portugues
TC de abdome sem contraste, corte axial, evidenciando dilatação de alças intestinais e nível hidroaéreo. Fonte: Radiologia Brasileira
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Tratamento do abdome agudo obstrutivo

O tratamento da obstrução intestinal é, na maioria das vezes, cirúrgico. São indicações de cirurgia imediata a ruptura, sinais de isquemia e a obstrução total.

Entretanto, nas obstruções intestinais parciais pode-se realizar uma conduta expectante quando houver a presença de eliminação de gases e fezes. Essa deve ser associada a medidas de hidratação, sondagem intravesical de demora - a fim de monitorar o débito urinário - e a colocação de sonda nasogástrica para promover conforto e evitar a broncoaspiração.

Também é preciso realizar a antibioticoterapia de largo espectro que deve ser realizada profilaticamente. Indica-se o ciprofloxacino, na dose de 400 mg, via endovenosa de 12 em 12 horas, associado ao metronidazol endovenoso na dose de 500 mg de 8 em 8 horas. E mais, o uso de antieméticos, como a metoclopramida e a ondansetrona podem ser indicados.

Tratamento do fecaloma

Em casos que o indivíduo apresentar um fecaloma é possível realizar o tratamento com enemas repetidos e esvaziamento manual sob anestesia. Entretanto, em caso de obstrução alta, não se deve realizar a manobra manual, e a lavagem com solução glicerinada com soro morno através de sonda deve ser performada. Caso não haja sucesso, deve-se optar pelo tratamento cirúrgico com ressecção do sigmóide junto ao fecaloma.

Tratamento de volvo do sigmóide

Em casos em que há um volvo do sigmóide, o tratamento irá depender da presença ou não da necrose. Quando essa está ausente, opta-se pela realização da retossigmoidoscopia descompressiva. Entretanto, na presença de necrose, o tratamento a ser instituído deve ser a ressecção cirúrgica da alça necrosada.

Conclusão

O abdome agudo obstrutivo é um quadro comum e potencialmente grave. O reconhecimento do seu quadro, através de anamnese e exame físico detalhados, são fundamentais para uma possível recomendação de cirurgia precoce. O atraso do reconhecimento do seu quadro pode pôr em risco a vida do paciente e, por isso, é fundamental que todo médico generalista domine este quadro.

Continue lendo:

FONTES:

  • ZATERKA, S., EISIG, J. N. Tratado de Gastroenterologia: da Graduação à Pós-Graduação. 2ª ed. São Paulo: Editora Atheneu, 2016.
  • FAUCI, Jameson. et al. Medicina Interna de Harrison. Porto Alegre: AMGH, 2020.

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