Cardiologia
Cardiologia

Hipertensão pulmonar: tipos, causas, sintomas e tratamento

Logo Medclub
Equipe medclub
Publicado em
8/5/2024
 · 
Atualizado em
8/5/2024
Índice

A hipertensão pulmonar (HP) é uma condição que afeta 15 em cada 1 milhão de indivíduos, sendo mais comum em mulheres, especialmente na faixa etária entre 20 e 40 anos. Além disso, cerca de 10% dos casos são atribuídos a fatores hereditários. A incidência da doença é cerca de 2,4 / milhão de habitantes.

Levando em consideração a população brasileira, estima-se que haja cerca de 3500 pacientes com o problema, e devido às nossas peculiaridades, como a esquistossomose, esse número pode ser ainda maior. Assim, embora a prevalência seja baixa, a hipertensão pulmonar é frequente em várias outras condições, enfatizando a importância de um diagnóstico preciso.

O que é a hipertensão pulmonar?

A hipertensão pulmonar abrange um conjunto de condições que afetam a circulação nos vasos sanguíneos dos pulmões, caracterizada pelo aumento das pressões arteriais pulmonares (pressão arterial pulmonar média (PAPm) > 22 mmHg ou PAP sistólica estimada > 36 mmHg).

Sem tratamento, a condição apresenta uma elevada taxa de mortalidade, sendo a insuficiência cardíaca direita descompensada a causa mais frequente de óbito. Avanços substanciais têm sido feitos no entendimento da patogênese, diagnóstico e classificação. Apesar desses avanços, ainda persiste um atraso significativo no diagnóstico, podendo chegar a até 2 anos.

Fisiopatologia

A vasoconstrição, a proliferação vascular, a trombose e a inflamação são consideradas os principais elementos que contribuem para o desenvolvimento da HAP. Na vasculatura pulmonar, é comum encontrar proliferação e fibrose na camada íntima, hipertrofia na camada média e trombose in situ

No estágio inicial da doença, o remodelamento vascular geralmente está concentrado nos pequenos ramos distais da artéria pulmonar. Conforme a doença progride, a proliferação da camada íntima e o remodelamento patológico avançam, levando a uma diminuição na complacência vascular pulmonar

Isso resulta em um aumento gradual na resistência vascular pulmonar total e, consequentemente, na carga sobre o ventrículo direito. Em casos de hipertensão pulmonar moderada a grave, o aumento na resistência vascular pulmonar leva a um aumento correspondente na PAPm até que o débito cardíaco seja afetado e comece a diminuir. 

Com a diminuição do débito cardíaco, a pressão arterial pulmonar também diminui. Como resposta compensatória, ocorre taquicardia, o que reduz o período de enchimento ventricular e, consequentemente, a pré-carga. Isso resulta em uma diminuição na fração do volume sistólico disponível para distender a vasculatura pulmonar.

Foram identificadas anomalias em múltiplas vias moleculares e genes que regulam as células endoteliais e musculares lisas da vasculatura pulmonar. Essas anomalias incluem redução da expressão do canal de potássio regulado por voltagem, mutações no receptor 2 da proteína morfogenética do osso e aumento da expressão do fator tecidual, entre outras

Isso leva à redução na apoptose das células musculares lisas e ao surgimento de células endoteliais resistentes à apoptose, resultando em acúmulo e obstrução vascular. Além disso, a deposição de trombina na rede vascular pulmonar, proveniente de um estado pró-trombótico ou disfunção endotelial, pode contribuir para a arteriopatia obstrutiva.

{{banner-cta-blog}}

Tipos de hipertensão pulmonar 

A HP é uma mistura de diversas patologias no qual o único identificador é a elevação da pressão arterial pulmonar média em relação à pressão atrial esquerda. O atual sistema de classificação, revisado em 2013, reconhece cinco categorias de hipertensão pulmonar:

  1. Hipertensão arterial pulmonar (HAP);
  2. HP causada por doença cardíaca esquerda;
  3. HP causada por doença pulmonar crônica; 
  4. HP associada a tromboembolismo crônico; 
  5. Grupo de doenças variadas que raramente causam HP.

Hipertensão pulmonar pré-capilar

A definição de HP pré-capilar requer os seguintes parâmetros:

  • Aumento da PAPm > 25 mmHg; 
  • Pressão de oclusão da artéria pulmonar (POAP), pressão atrial esquerda, ou pressão diastólica final do ventrículo esquerdo (PDFVE) ≤ 15 mmHg; 
  • RVP > 3 unidades Wood. 

Hipertensão pulmonar pós-capilar

A HP pós-capilar pode ser subdividida em duas categorias distintas: passiva e reativa. Na forma passiva, o gradiente transpulmonar (diferença entre a pressão arterial pulmonar média e a pressão de oclusão da artéria pulmonar) é inferior a 12 mmHg. 

Por outro lado, na forma reativa, o gradiente transpulmonar é maior que 12 mmHg, acompanhado de um aumento na resistência vascular pulmonar (RVP). Em ambas as situações, o débito cardíaco (DC) pode estar dentro da faixa normal ou diminuído. 

Hipertensão arterial pulmonar

A HAP é uma condição relativamente rara que abrange um conjunto de doenças que resultam no remodelamento das artérias pulmonares pré-capilares, caracterizado pela fibrose da camada íntima, aumento da espessura da camada média, obstrução das arteríolas pulmonares e lesões plexiformes típicas

Ela é diagnosticada quando há uma elevação sustentada na PAPm em repouso igual ou superior a 25 mmHg, uma RVP > 240 dina-s/cm5 e uma POAP ou PDFVE ≤ 15 mmHg, conforme determinado por cateterismo cardíaco direito. 

No grupo II estão os pacientes com insuficiência cardíaca esquerda, doença valvar aórtica e mitral e insuficiência cardíaca com fração de ejeção preservada (ICFEP). A principal característica desse grupo é o aumento da pressão atrial esquerda resultando em hipertensão venosa pulmonar. Geralmente, tanto o gradiente transpulmonar quanto a resistência vascular pulmonar (RVP) permanecem dentro dos limites normais.

Doença pulmonar intrínseca é a segunda causa mais comum de hipertensão pulmonar, sendo, em geral, uma doença modesta. No entanto, alguns desses pacientes parecem desenvolver o problema de forma "desproporcional" à doença do parênquima pulmonar, o que sugere a presença de doença arterial pulmonar intrínseca.

A incidência de hipertensão pulmonar após obstrução tromboembólica crônica das artérias pulmonares é considerada baixa, mas pode aumentar com episódios recorrentes de embolia. 

A obstrução da vasculatura pulmonar proximal é crucial e muitas vezes é o principal fator para desenvolvimento do quadro. Cerca de 10% a 15% dos pacientes desenvolvem uma condição semelhante à hipertensão arterial pulmonar após a ressecção do trombo proximal. Outras doenças que afetam a vasculatura pulmonar são: sarcoidose, anemia falciforme e esquistossomose

Sinais e sintomas de hipertensão pulmonar 

Os sintomas de hipertensão pulmonar são inespecíficos, insidiosos e comuns a diversos outros quadros, como asma e outras doenças pulmonares e cardíacas. A maioria dos pacientes relata dispneia e/ou fadiga como sintomas principais, enquanto edema, dor torácica, pré-síncope e síncope são menos frequentes e geralmente estão associados a estágios mais avançados da doença.

Conforme a condição avança, podem surgir sinais de insuficiência ventricular direita, como aumento da pressão venosa jugular, edema nos membros inferiores e ascite. Também é possível haver sinais de insuficiência ventricular direita com aumento da pressão venosa jugular e edema de membros inferiores. 

Além disso, o exame cardiovascular pode revelar acentuação do componente pulmonar da segunda, terceira ou quarta bulha cardíaca de cavidades direitas e sopro holossistólico de insuficiência tricúspide.

Como realizar o diagnóstico?

O ecocardiograma com estudo de bolhas é o teste de rastreamento inicial mais importante. A ecocardiografia também é importante para a determinação de causas específicas. Todos os tipos de hipertensão pulmonar podem demonstrar um ventrículo direito dilatado e hipertrofiado com PAP sistólica estimada elevada.

A. Nesta imagem de ecocardiograma, é possível observar um corte apical de quatro câmaras de um paciente com hipertensão pulmonar, evidenciando aumento do átrio e do ventrículo direitos, com alguma compressão das cavidades cardíacas esquerdas. B. Já neste corte ecocardiográfico, é apresentado um exame normal. Fonte: Harrison
A. Nesta imagem de ecocardiograma, é possível observar um corte apical de quatro câmaras de um paciente com hipertensão pulmonar, evidenciando aumento do átrio e do ventrículo direitos, com alguma compressão das cavidades cardíacas esquerdas. B. Já neste corte ecocardiográfico, é apresentado um exame normal. Fonte: Harrison

A ecocardiografia é geralmente um excelente exame de triagem para afastar a necessidade de investigações complementares. No entanto, em caso de o ecocardiograma apresentar-se normal, mas ainda existir a dúvida quanto à possibilidade de HP (dispneia ou hipoxemia sem explicação), pode-se realizar o teste de esforço cardiopulmonar para diferenciação entre causas cardíacas e pulmonares.

Se o teste de esforço se apresentar alterado, pode-se proceder com o cateterismo de câmaras direitas para um diagnóstico definitivo. O monitoramento hemodinâmico invasivo com teste de vasorreatividade vascular pulmonar é o padrão-ouro para o diagnóstico, a avaliação da gravidade da doença e seleção da terapia clínica apropriada. 

Vasodilatadores de ação curta, como o óxido nítrico inalado ou o epoprostenol inalado, são preferidos para testes de vasodilatação. A resposta ao vasodilatador é considerada positiva quando há uma redução na PAPm de pelo menos 10 mmHg para um nível absoluto igual ou inferior a 40 mmHg, sem redução no débito cardíaco (DC). 

Causas de hipertensão pulmonar

Após o diagnóstico de hipertensão pulmonar, a etiologia subjacente deve ser investigada com exames de imagem do tórax e testes de função pulmonar. O raio-X e a tomografia computadorizada (TC) podem evidenciar o aumento das artérias pulmonares centrais, a “amputação vascular” e aumento de átrio e ventrículo direitos

Radiografia do tórax em posteroanterior (à esquerda) e perfil (à direita) mostrando aumento das artérias pulmonares (setas pretas) e amputação da vasculatura pulmonar distal (seta branca). Fonte: Harrison
Radiografia do tórax em posteroanterior (à esquerda) e perfil (à direita) mostrando aumento das artérias pulmonares (setas pretas) e amputação da vasculatura pulmonar distal (seta branca). Fonte: Harrison

Contudo, a TC também pode apresentar evidências de congestão venosa, como infiltrado centrolobular em vidro fosco e espessamento das linhas septais. Se não houver doença cardíaca esquerda, esses achados podem indicar doença venosa pulmonar, uma causa incomum de hipertensão arterial pulmonar (HAP). Ademais, a TC é crucial para diferenciar doença intersticial pulmonar coexistente ou enfisema.

Tomografia computadorizada do tórax representativa revelando artérias pulmonares principais aumentadas. Fonte: Harrison
Tomografia computadorizada do tórax representativa revelando artérias pulmonares principais aumentadas. Fonte: Harrison

A angiotomografia computadorizada é comumente usada para investigar doença tromboembólica aguda. Ainda, a cintilografia pulmonar de ventilação-perfusão (V̇/Q̇) pode ser utilizada para triagem na qualificação de pacientes com indicação de intervenção cirúrgica. Um exame de V̇/Q não demonstrando efeitos perfusionais praticamente elimina a possibilidade de hipertensão pulmonar tromboembólica crônica.

Os distúrbios respiratórios do sono são outra causa importante, mas a indicação de polissonografia depende da história clínica do paciente. A dessaturação noturna é um achado comum na HP, mesmo quando não há distúrbio respiratório do sono.

Entre os testes laboratoriais considerados importantes estão: anti-HIV, fatores antinucleares, fator reumatoide, anticorpos anti-scl-70, testes de função hepática e sorologia para hepatite para rastreamento das doenças mais associadas à HP. 

O BNP e a fração N-terminal do precursor do peptídeo natriurético cerebral (NT-pro-BNP) também são úteis, pois mantêm correlação com a disfunção ventricular direita, a gravidade hemodinâmica e o estado funcional em pacientes com HAP.

{{banner-cta-blog}}

Tratamento da hipertensão pulmonar

Sem tratamento, a hipertensão arterial pulmonar é invariavelmente fatal. Embora não haja cura, as terapias farmacológicas atuais têm reduzido a morbidade e, em alguns casos, a mortalidade.

A disfunção endotelial e a ativação plaquetária causam um desequilíbrio nos metabólitos do ácido araquidônico, com redução nos níveis da prostaciclina e aumento na produção do tromboxano A. Todas as medicações irão atuar na redução da pressão pulmonar e melhora da capacidade funcional do paciente. Veja a seguir  as terapias aprovadas pela Food and Drug Administration para o tratamento da hipertensão arterial pulmonar: 

Nome genérico Via de administração Classe do fármaco Indicação
Epoprostenol IV Derivado da prostaciclina tratamento da HAP para melhorar a capacidade de exercício
Iloprosta Inalatório Derivado da prostaciclina Tratamento da HAP para melhorar um desfecho composto formado por tolerância aos exercícios, sintomas (classe da NYHA) e ausência de deterioração clínica
Treprostinila IV ou SC Derivado da prostaciclina Tratamento da HAP para reduzir sintomas associados aos exercícios
Treprostinila Inalatório Derivado da prostaciclina Tratamento da HAP para melhorar a capacidade de exercício
Treprostinila VO Derivado da prostaciclina Tratamento da HAP para melhorar a capacidade de exercício
Selexipague VO Agonista seletivo do receptor da IP Tratamento da HAP para melhorar um desfecho composto de ausência de deterioração clínica
Bosentana VO Antagonista do receptor da endotelina Tratamento da HAP para melhorar a capacidade de exercício e para reduzir a deterioração clínica
Ambrisentana VO Antagonista do receptor da endotelina Tratamento da HAP para melhorar a capacidade de exercício e retardar a deterioração clínica
Macitentana VO Antagonista do receptor da endotelina Tratamento da HAP para melhorar um desfecho composto de retardo da deterioração clínica
Sildenafila VO Inibidor da PDE-5 Tratamento da HAP para melhorar a capacidade de exercício e retardar a deterioração clínica
Tadalafila VO Inibidor da PDE-5 Tratamento da HAP para melhorar a capacidade de exercício
Riociguate VO Estimulador solúvel da
guanilil ciclase
Tratamento da HAP para melhorar a capacidade de exercício

Conclusão

A hipertensão pulmonar é uma condição complexa e desafiadora, sobretudo na realidade brasileira, pois, apesar de sua baixa prevalência, possui um impacto significativo na qualidade de vida e na sobrevida dos pacientes, devendo, assim, fazer parte dos diagnósticos diferenciais na prática clínica. 

Continue aprendendo:

FONTES:

  • Medicina interna de Harrison | Porto Alegre; AMGH; 19 ed; 2017.
  • Saldanha Menna Barreto S. Pneumologia: No Consultório. 1 ed. Artmed; 2008.

+400 de aulas de medicina para assistir totalmente de graça

Todas as aulas são lideradas por autoridades em medicina.

Artigo escrito por

Tenha acesso a todos os conteúdos totalmente de graça

Através de um simples cadastro, você estará livre para consumir o que quiser do medclub!

Dúvidas?

O que é o MedClub?

O medclub é uma plataforma 100% gratuita focada no desenvolvimento e capacitação profissional dos médicos. Com videoaulas e materiais de apoio de alta qualidade, o médico é alavancado em uma dinâmica simples, clara e objetiva de atualização e aprimoramento dos conhecimentos essenciais à sua prática.

Como o MedClub pode me beneficiar?

O Medclub te proporciona a aplicabilidade prática da Medicina Baseada em Evidências, elevando o padrão da sua prática médica. Tudo isso em um só lugar, sem perda de tempo, com informações claras e fáceis de achar no dia a dia.

O MedClub beneficia médicos de diferentes níveis de experiência?

Sim! O MedClub foi cuidadosamente concebido e desenvolvido com o objetivo de simplificar o estudo e a atualização médica, proporcionando maior segurança nas práticas e procedimentos. Nossa plataforma visa melhorar os resultados diários dos médicos, abordando as principais preocupações independentemente do estágio de sua carreira.

Nós utilizamos cookies. Ao navegar no site estará consentindo a sua utilização. Saiba mais sobre o uso de cookies.